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Violência policial aumenta no Brasil: 6160 mortes em 2018

Violência policial aumenta no Brasil: De acordo com o 13° Anuário Brasileiro de Segurança Pública, em 2018, 11 em cada 100 mortes violentas foram provocadas por ações policiais, prejudicando a segurança pública.

Charge: Carlos Latuff

SEQUESTRADOR DO ÔNIBUS NA PONTE RIO-NITERÓI MORRE E BOLSONARO PARABENIZA POLICIAIS

Um depoimento de violência policial

Eu estava na rua perto do Bar, sentado na calçada conversando com um amigo meu. Foi quando veio uma viatura virou na esquina e parou na nossa frente, bem na hora ele levantou e foi para dentro do bar, então os policiais só pegaram eu. Eles chegaram falando vai ladrão encosta, você está preso, me viraram, colocaram a algema e não falaram mais nada.” 

Depoimento anônimo

Esse episódio aconteceu em 2006, o jovem não quer se identificar, na época ele tinha 26 anos e tudo aconteceu na Zona Leste de São Paulo. O homem relatou que logo depois levaram-no para uma rua próxima, onde havia um carro roubado e assim pressionaram para que ele confessasse que teria sido o ladrão. Os policiais ainda o ameaçaram que se ele não assumisse iam levar ele para um córrego que ficava próximo do local e colocariam fim a sua vida.

A vítima da violência policial é branco, hoje é casado, tem um filho e trabalha como mecânico. A ação durou mais de uma hora, ele negou o crime até que o liberassem. Os policiais mandaram ele correr por uma rua que estava vazia, com medo, ele não correu e foi para o outro lado onde tinham outras pessoas. 

Eram policiais militares, o homem disse que não buscou nenhuma autoridade. “Vai que eu chegando lá com a pressão dos policiais em cima da vítima do assalto ela me acusaria”, disse ele. Depois do ocorrido ele não ficou mais na rua. 

Já se passaram 13 anos, mas ele diz que ainda hoje em algumas situações tem medo da polícia. Não é apenas ele que sente isso, segundo uma pesquisa do Datafolha, publicada em abril de 2018, apenas 47% da população confia na polícia e 51% afirma ter medo da polícia. 

A VIOLÊNCIA VISTA COMO SOLUÇÃO PARA O CRIME

13° Anuário Brasileiro de Segurança Pública: dados alarmantes

O Fórum Nacional de Segurança Pública levanta todos os anos dados sobre violência policial e ao analisar é possível identificar um aumento de mortos por policiais, tanto em serviço como fora de serviço, desde a publicação de 2013. 

O 13° Anuário Brasileiro de Segurança Pública mostrou que 11 em cada 100 mortes violentas intencionais foram provocadas pela polícia. Os dados, referente a 2018, foram fornecidos pelas secretarias de segurança pública estaduais, pelo Tesouro Nacional, pelas polícias civis, militares e federal, entre outras fontes oficiais da área. 

A publicação foi este ano e os números absolutos mostram 6220 assassinados. O estado com mais vítimas é o Rio de Janeiro com 1534 mortes. Logo depois vem São Paulo, 851, Bahia, 794, e o Pará com 672 mortos. 

A pesquisa também diferenciou as mortes decorrentes de intervenções de Policiais Civis em serviço 119 vítimas e fora de serviço 44 vítimas. Já as ocorrências de Policiais Militares em serviços têm o valor de 3126 mortos e fora de serviço 320 mortos. 

Dos 26 estados brasileiros 21 deles disponibilizaram as informações ao falar do dos mortos por Policiais Militares em serviço. O estado da Bahia tem o maior número, 746, seguido por São Paulo, 642, e Goiás, 416. Os dados do Rio de Janeiro, Pernambuco e Sergipe não foram divulgados em nenhuma das categorias de separação.

É importante destacar o perfil dessas vítimas, a primeira característica a se observar é que 99,3% eram do sexo masculino. Um outro ponto a ser levado em conta é a raça 75,4% eram negros. A chance de um jovem negro ser vítima de homicídio no Brasil é, em média, 2,5 vezes superior à de um jovem branco, o que leva ao índice de desigualdade racial. 

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Dados retirados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2019 – Gabriela Neves

VIOLÊNCIA EM SÃO PAULO – OS EXTREMOS DA CIDADE

Quanto a idade dos executados a maioria tem entre 20 e 24 anos. 81,5 completaram apenas o ensino fundamental, portanto outra característica é a baixa escolaridade. Ainda é possível apontar que 40,8% dos assassinatos aconteceram de madrugada.

A polícia é um órgão de estado que independe de governo e o seu papel é garantir que a ordem e que as leis sejam cumpridas. A polícia não tem inimigos, como o exército que é treinado para combates. Assim a polícia enfrenta a criminalidade, porém no Brasil não existe um protocolo de atuação o que faz com que tenha variação nas ações.

O consultor do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) Paulo Roberto Oliveira explicou sobre a conduta dos policiais e sobre o  que deve ser feito para que ocorra uma melhora. “Quando a gente fala de qualquer tipo violação na área de direitos humanos ele vai ter que passar por doutrina, ensino, sanções e treinamento, não vai ter como fugir disso”, disse Paulo.

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Paulo Roberto de Oliveira durante coletiva de imprensa – Giovanna Franchini

A FAVELA AINDA É SENZALA

Paulo também é  Coronel da Reserva da Polícia Militar do Distrito Federal e diz que é importante trazer conhecimento a polícia. Portanto o diálogo do CICV com as forças policiais é demonstrar que as Normas Internacionais dos Direitos Humanos (DIDH) visa trazer segurança jurídica para atuação policial.

Segundo o consultor do CICV a segurança jurídica vem em dois aspectos, tanto para o policial que está trabalhando, como para a população. Todos precisam conhecer e saber que o procedimento vai ser cumprido. Se isso acontecer vai haver segurança pros dois, para a polícia e para a comunidade, ele diz que essa é a parte mais importante e que leva tempo.

Para Vitor Blotta, pesquisador associado do Núcleo de Estudos da Violência da USP, a força policial só deve ser usada quando necessária, dentro dos limites capazes de repelir e levando em conta os direitos à vida e à dignidade. 

Vitor também é professor e usa o sociólogo francês Émile Durkheim para exemplo. Émile Durkheim propõe que a punição deve ser aplicada somente quando a violação da lei é tão severa e sistemática que ameaça sua autoridade como tal. “Para outros casos, deveriam ser utilizadas outras formas de defesa, reparação ou resolução de conflitos”, afirma o pesquisador. 

Por Gabriela Neves – Fala! Puc

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