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Paulo Mateus, profeta e maluco de estrada

Por Raquel Cintra Pryzant – Fala!MACK

Definir um maluco de estrada é muito difícil, quase impossível. Já se nasce maluco, ninguém vira. Pode ser um dom, uma qualidade ou um defeito, mas vem de berço.

Paulo Mateus nasceu assim e conta que ser maluco de BR vai além dos dreads, pulseiras de macramê e uma barba longa. Essa filosofia é um conjunto de atitudes e ideias perante a vida.

Maluco não é hippie, e menos ainda camelô. É um movimento de contracultura de mais de 40 anos que vive o paradigma do que é “ser maluco”. Cada região tem códigos e valores pré estabelecidos que podem se tornar prisões, mesmo em um movimento libertário.

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“Excluir em um grupo de excluídos é foda.”

Comenta Paulo, que vêm desconstruindo seus conceitos e orientando jovens malucos a terem ideias mais aceitáveis.

Malucos do norte e nordeste são mais conservadores. Lá se cumprimenta a maluca de outro com um aperto de mão, jamais com um abraço, por respeito.

Já no sul e no sudeste existem casos de malucas que enfrentaram outras, inclusive fisicamente, pelo direito de se vestir como quiserem. Hoje frequentam a pedra (local onde só malucos expõem seus artesanatos) sem as saias longas do costume.

A comparação com camelôs engrossa seu humor: “maluco com maquininha de cartão não é maluco”. Ser artesão é a forma que os malucos tem de não alimentar o sistema. Seus trampos são criados a partir do que encontram na viagem. Dentes de animais, pedras, penas, cobre e itens descartados.

O coletivo Beleza da Margem foi o primeiro a documentar o movimento com o filme Malucos de Estrada 1 e 2, dirigido por Rafael Lage.

Paulo conhece malucos rastafaris, cristãos, ateus, satanistas e bruxos, como ele. “Meus amigos dizem que eu sou o mago da parada, mago psicodélico”. Além de fazer previsões, costuma falar de alienígenas do passado e do presente em suas histórias.

“Mad Max alienígena da BR” é outro apelido, conferido por sua arte, de estilo Steampunk. Peças de relógio, engrenagens, chapas e motores unidos por filigranas (técnica medieval de trabalho em metal) formam diferentes máscaras, óculos e braços articulados.

“Desde novo sou entendido que sou artista. Eloquente nas minhas ideias e extravagante mesmo. Fervoroso em minhas decisões”

Para entrar nesse mundo fechado não basta comprar um kit e cair na estrada. Para Paulo, antes de romantizar a liberdade, os jovens deveriam se perguntar mais: “Será que ele comeu?” “Ele não deve vender muito..” e “Cara, como ele arruma esse material?”

Os malucos dormem no chamado Mocó que, pra variar, só entra Maluco. Lá você seria tratado como um irmão. Quando quisesse comer, beber, fumar ou cheirar, o grupo te fortaleceria. “Meu pão é seu pão, minha matéria é sua matéria”. Uma vez que abraçar isso, você será protegido também das coisas ruins. Se alguém te fizer mal, a “rádio cipó” formada por malucos de norte a sul, de leste a oeste e até de fora do Brasil é acionada. Cedo ou tarde encontrarão o sujeito.

“Maluco trabalha muito o desapego.”

Primeiro, de sua família. Depois do seu conforto e bens materiais. Por último, uma elevação do desapego que poucos conhecem.

Para a iniciação neste caminho, o maluco deve enfrentar as feras e intempéries da estrada sozinho durante um ano. Como no treinamento grego agogê, do filme 300, espera-se que este período tenha o poder de transformar o olhar de uma pessoa. “Maluco de estrada é sobrevivência, a gente ta matando um leão por dia”, completa Paulo.

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Quer saber mais sobre o movimento Malucos de BR? Rafael Lage te conta neste vídeo:

https://www.youtube.com/watch?v=YMkcAKIRtq0

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