Publicado em 1968, o AI-5 ficou conhecido como o Ato Institucional mais severo promulgado durante o período da Ditadura Militar (1964-1989). Iniciava-se com ele, os Anos de Chumbo da ditadura. A norma resultou no fechamento do Congresso Nacional, na censura dos meios de comunicação, do cinema, das artes, da música e de qualquer manifestação que não fosse aos moldes da ditadura. Assim, de 1968 a 1978, foram dez anos marcados por tortura, prisões, repressão e mortes. O arbítrio atingiu seu ponto máximo com o AI-5.
Durante o período no qual o AI-5 estava em vigor, o objetivo dos jornais era esconder corrupção, torturas, violências policiais e até epidemias. Os proprietários dos meios de comunicação adotaram duas posturas: curvar-se diante das ameaças do governo ou resistir ao arbítrio. Esta segunda postura teve poucos adeptos, a maioria pertencente à imprensa alternativa, desvinculada do poder e do capital.
Havia dificuldade de acesso às fontes de informação. É nessa época que proliferam as declarações em off (quando o entrevistado não quer que seu nome seja publicado) e as assessorias de imprensa. Jornalistas que tentassem questionar as informações oficiais perdiam suas credenciais.
43 anos depois do fim do Ato Institucional, desde a ascensão do atual governo de extrema-direita, do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), e de seus apoiadores, o AI-5 continua sendo constantemente mencionado como forma de apoio do governo à Ditadura Militar ou como forma de ataque à liberdade de imprensa.
Apologias ao AI-5: sutis ataques à liberdade de imprensa
Em fevereiro deste ano, o deputado bolsonarista, Daniel Silveira (PSL-RJ) gravou um vídeo em apologia ao AI-5 e defendeu a destituição de ministros do Supremo Tribunal Federal, atos considerados inconstitucionais. Ele foi preso em flagrante no Rio. No vídeo, Silveira ataca seis ministros do Supremo: Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello e Dias Toffoli. Após decisão da Câmara dos Deputados, o deputado segue em prisão domiciliar.
Já em 2020, em meio à pandemia do novo coronavírus, a participação do presidente Jair Bolsonaro em uma manifestação pró AI-5 em frente ao Quartel General do Exército, em Brasília, gerou revolta em diversas lideranças políticas do País. Diante de diversas declarações, o procurador-geral da República, Augusto Aras, afirmou em nota que é preciso estar atento para os “extremos” que “enfraquecem a nossa democracia participativa”.
Em 2019, foi a vez do Deputado Federal, Carlos Bolsonaro (Republicanos), o zero três, fazer uma declaração polêmica acerca do AI-5. Em entrevista, Carlos afirmou que caso os protestos no Chile se repetissem em solo brasileiro, um novo AI-5 poderá ser editado.
Se a esquerda radicalizar a esse ponto, a gente vai precisar ter uma resposta. E uma resposta pode ser via um novo AI-5, pode ser via uma legislação aprovada através de um plebiscito como ocorreu na Itália. Alguma resposta vai ter que ser dada.
Após a fala polêmica do filho do presidente, em novembro do mesmo ano, o Ministro da Economia, Paulo Guedes, em uma coletiva em Washington declarou: “Não se assustem se alguém pedir o AI-5”, disse o ministro ao comentar possibilidade de protestos no Brasil.
Nesse sentido, a imprensa durante a ditadura não podia realizar seu verdadeiro trabalho de levar informação correta à sociedade. Em três anos de governo, em várias ocasiões, Jair Bolsonaro, seus filhos e apoiadores exaltaram o período do regime militar. Bolsonaro, inclusive, questiona a ocorrência de um golpe de Estado em 1964, quando os militares assumiram o poder à força. O reforço dessa narrativa e as menções positivas ao AI-5 vão não só contra a Constituição Federal de 1988, como também afeta e ameaça a liberdade de expressão e de imprensa ao defender a volta desse período perante a sociedade. Fazendo com que muitos brasileiros passem a desconfiar da própria imprensa brasileira.
Só em 2019, segundo a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Bolsonaro fez 116 ataques à imprensa. Já em 2020, esse número cresceu para 245. Sendo assim, as constantes menções ao AI-5 buscam também amedrontar, afetar e descredibilizar os meios de comunicação, assim como os militares fizeram em 1968.
______________________________
Por Maria Júlia Melo – Fala! Uerj