A atriz Karol Lannes – mais conhecida pelo seu papel na novela sucesso Avenida Brasil, onde interpretava Ágatha, filha de Carminha – recentemente compartilhou em suas redes sociais o motivo de nunca mais ter aparecido nas telinhas: após anos de contrato com a rede Globo, um diretor afirmou para a atriz que ela teria que ”emagrecer absurdamente” se quisesse continuar na TV. Ainda em seu relato, Karol também conta que, após Avenida Brasil, o único teste que lhe foi oferecido foi em Malhação, para interpretar uma personagem gorda que sofria bullying.
Estudante de Artes Cênicas, criadora de conteúdo e também professora de Inglês nas horas vagas, Karol levanta diversas bandeiras em suas redes sociais e se coloca na linha de frente para combater o tabu que é a gordofobia e o preconceito relacionado ao assunto. Ao partilhar o motivo da sua saída da emissora no TikTok, além de uma história importante ser divulgada, outro ponto interessante é colocado em vista: corpo realmente define talento? E se não, por que não vemos atrizes gordas protagonizando na televisão?
Gordofobia
Em Avenida Brasil, Ágatha é uma criança gorda que, desde sempre, sofre desprezo e preconceito pela própria mãe exatamente devido ao seu peso. Quando vemos gordas contracenando nas telas, são em papéis onde elas normalmente interpretam apenas mulheres gordas sem nenhum outro tipo de conteúdo, quando não estão sofrendo bullying, estão participando de comerciais de produtos para emagrecer, podem ser ”só” as melhores amigas das meninas magras e ”bonitas”, ou há simplesmente uma glorificação da magreza, mostrando como a pessoa gorda é ”infeliz” até emagrecer.
Se a arte é a representação da sociedade, esse preconceito escancarado é apenas um retrato do padrão que estamos acostumados a viver no social. Escancarado, mas ainda velado em discussões sociais.
Quantas vezes não ouvimos meninas nitidamente magras falando que estão gordas? Ou elogios para uma mulher com mais curvas, como ”nossa, ela é tão bonita, mas só de rosto”, como uma forma indireta para chamá-la de gorda? O famoso ”falo para emagrecer porque quero seu bem”? Essas e outras falas comumente ouvidas destacam o terror em volta da ideia de uma mulher mais encorpada, com um manequim que não seja 36, com um corpo diferente do habitualmente visto desfilando nas passarelas.
Então, retomando a pergunta de três parágrafos anteriores, não vemos atrizes gordas protagonizando na arte, pois estamos todos presos em um ciclo doentio onde somos ensinados a crer que, aos nossos olhos, gordura é feio, anormal, antiético, ofensivo e desinteressante.
Ao mesmo tempo em que, naturalmente, aprendemos a relacionar magreza à saúde, o que já foi afirmado por endócrinos que não é a realidade. Exaltamos a magreza de tal forma que não apenas anulamos os corpos, como esquecemos das pessoas, dos talentos, da essência e da alma.
Resistência artística à gordofobia
Em meio ao caos dos estereótipos, encontramos movimentos artísticos que reafirmam a diversidade e o respeito, um dos exemplos que podem ser citados é o da artista ativista Rachele Cateyes, que, em 2015, criou uma série de ilustrações (chamada “Glorifying Obesity”), onde ela protesta contra a gordofobia que ela mesma é vítima. Outra variante artística que pode ser citada são os filmes, um deles Gostosas, Lindas e Sexies, que é uma produção nacional onde quatro amigas manequim plus size protagonizam e se aventuram na cidade do Rio de Janeiro.
É importante ressaltar que os meios de mídia, arte e afins ainda têm muito o que mudar para deixar de reafirmar preconceitos e padrões para a sociedade, uma vez que grande parte de suas produções são focadas em padrões (do que é visto como bonito e comum) para a população. Então, ao consumir conteúdos que acolhem a diversidade, além de abrir sua mente, coração e alma, ainda dá palco para assuntos que precisam de muita visibilidade, conscientização e espaço de aceitação. Um corpo bonito é um corpo onde tem uma pessoa feliz dentro.
A busca sem fim
Na procura do inalcançável, mulheres se expõem a cirurgias de alto risco, em busca de uma magreza que vai além do número do manequim. A Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética destaca o Brasil como o país que mais realiza cirurgias plásticas no mundo, e no início de 2021, encontramos um aumento de 50% na procura por esses procedimentos em relação ao mesmo período do ano anterior.
Uma das cirurgias que se destacaram nas mídias sociais foi a lipoaspiração HD, procedimento que faz a sucção da gordura em determinada região do corpo e depois usa a mesma para dar mais destaque aos músculos, podendo deixar a área escolhida com a aparência de ”definida”. Se a cirurgia for feita na barriga, o aspecto seria o de um tanquinho, por exemplo.
Diversas influencers famosas e já magras (consideradas dentro do ”padrão”) realizaram esse procedimento, como a influencer Viih Tube (agora participante do BBB21) e a cantora e atriz Giovanna Chaves, que ao postar em suas redes sociais sua decisão de mudança estética, viralizou e foi radicalmente criticada.
Um método semelhante ao citado acima (lipoaspiração) levou à morte de outra influencer, Liliane Amorim, que veio a falecer em janeiro de 2021 devido às complicações cirúrgicas. Ela abordava assuntos sobre moda e beleza, também estava aparentemente dentro do que dizem ser considerado ”aceito” pela sociedade.
Nunca saberemos o que se passa na cabeça de toda a população, logo, é impossível procurar algo com o objetivo da aprovação universal. Os corpos gordos e com mais curvas não estão ”bons”, contudo, os magros também não, porque em ambos os casos se nota seres humanos colocados em jogo.
O tão sonhado ”corpo perfeito” não passa de uma ideia vazia, generalizada, ilusória e muito relativa, onde a ideia de magreza imposta é inalcançável e custa vidas. Existem pessoas se submetendo a situações de risco em busca da aprovação externa, quando, na verdade, a que deveria ser debatida era a interna: aceitação. Quem disse o que é certo ou errado quando corpos são a pauta? O que é claro é que essa ”busca” está deixando mais pessoas tristes do que felizes, está machucando e apagando todas as outras belezas que não precisam ser vistas para serem notadas.
_________________________________
Por Sofia Carnavalli – Fala! Cásper