A cantora Manizha, do Tajiquistão, usa a sua influência na música para combater a violência doméstica e apoiar a causa LGBT+. Ela vive na Rússia, onde a homossexualidade é fortemente reprimida pelo conservadorismo do país. Para evitar as mulheres de serem agredidas em casa, a artista criou um aplicativo de celular para elas denunciarem os agressores. A cantora vem ganhando destaque por suas letras feministas e seu ativismo.
Conheça Manizha, cantora do Tajiquistão que fala sobre feminismo em suas canções
Manizha, em 2020, pisou no palco do Eurovision, uma competição para escolher a melhor música do ano da Europa, para dizer com uma canção: “toda mulher russa precisa saber, você é forte o suficiente, você vai quebrar a parede”. Estas palavras geraram ataques xenofóbicos sobre ela nas redes sociais, de pessoas que não aceitavam uma mulher estrangeira, que mora na Rússia e muçulmana de falar para o mundo da força feminina. Sua música e presença provocaram incômodo.
muçulmana de falar para o mundo da força feminina. Sua música e presença provocaram incômodo.
Essa é a música Russa Woman, a canção vencedora da Rússia para competir com os demais países europeus de melhor música no Eurovision , com 39,7% dos votos do público, em Moscou em 8 de março de 2021. Então a cantora conseguiu questionar um ideal de Estado russo conservador e machista para dizer ao mundo o quanto as mulheres são fortes, independentes e trabalhadoras no país.
Apesar de Manisha caracterizar a mulher russa, na verdade, amplia o seu sentido ao retratar frases que o sexo feminino ouve em todas as idades. Ela traduz o sentimento de medo e angústia que mulheres do mundo inteiro sentem e gera um senso de coletividade para quem precisava ao redor do globo saber que não está sozinha.
Na letra, Manizha encoraja a menina a não ter medo, perante um cenário de frases machistas, como “você está esperando por seu cavaleiro de armadura brilhante? Pobrezinho”, “você já tem mais de 30 anos, alô, cadê seus filhos?” e “em suma, você é linda, mas seria bom perder peso”. Esses conselhos foram ouvidos pela cantora na infância e outras mulheres do mundo todo já escutaram.
“Sempre ouvimos conselhos da nossa infância como ‘você precisa ser assim, você precisa ser assim. Sua saia deve ser mais longa ou mais curta. ‘ Esses estereótipos tornam nossas vidas tão ruins e estou cansada disso”, disse Manizha em entrevista à BBC.
As ameaças nas redes sociais envolveram desejar que o seu avião caísse e a sua presença fora da Rússia, mas o que mais a magoou foram os ataques à sua etnia. “Podem não gostar da minha voz nem da minha canção, mas o que me custa mais é quando percebo que não gostam de mim porque eu nasci no Tajiquistão”, disse a cantora na mesma entrevista à BBC.
Mas quem é Manizha?
Manizha transcende diversas culturas, representando as suas origens do Tajiquistão, a russa, a muçulmana, a feminina e a migrante. Ela nasceu em 1991 no Tajiquistão, uma ex-república soviética de maioria muçulmana, mas mudou-se para a Rússia quando a sua casa pegou fogo, durante a Guerra Civil do seu país e mudou-se com a família para Moscou, na Rússia. No novo lar, começou a estudar piano na escola de música, a qual deixou para treinar vocais em aulas particulares. Além de formar-se em psicologia na Universidade Estatal Russa de Humanidades.
Ao passar dos anos, os seus pais divorciados não incentivaram a escolha profissional dela devido não ser adequada para uma mulher muçulmana. O apoio veio da avó, que a encorajou a seguir a carreira da música, para homenageá-la Manisha alterou o seu sobrenome de Khamrayeva para Sangin. Outra mulher de referência para ela foi sua bisavó, a qual foi uma das primeiras mulheres no seu país natal a remover o véu e iniciar sua carreira, por consequência, teve os filhos tirados de seus cuidados.
Ela canta músicas em inglês e russo, mas coloca nas suas letras algumas palavras e termos do Tajiquistão. Além das palavras, as suas roupas representam as suas origens feitas pela sua mãe, a qual é design de moda.
Participação da cantora nas redes sociais
Em 2017, Manizha iniciou campanha contra padrões de beleza tóxicos com uma série de postagens no Instagram com a hashtag #TheTraumaOfBeauty. Na rede social, compartilhou uma história pessoal sobre a sua luta com a imagem corporal. “Eu sou eu e gosto dos meus rolos, da minha pele, da minha celulite. Indústria da beleza, você perdeu um cliente”, relatou ela. Também relatou a sua vivência:
“Meu corpo é minha casa, e por 26 anos eu odiei cada curva desta casa. Até agora, o ódio pelo meu próprio corpo me ajudou em apenas uma coisa: construir uma identidade online, o online-Manizha ideal que está sempre sorrindo em fotos tiradas do ângulo certo, envolto em roupas largas. Mas toda vez que eu acordo como uma Manizha off-line, que se odeia enquanto corre, e depois de apenas dois minutos de exercícios, quero cair morta. O ódio nunca ajuda. Estou farto dessa Manizha e não quero mais ser ela. Eu quero ser eu mesmo. Não tenho medo de falar sobre meus medos, meu tom de pele irregular, meus braços gordos e barriga macia e quadris redondos que são um pesadelo para caber em um par de jeans.”
Na sua luta contra a violência doméstica, em 2019, a cantora lançou um aplicativo de celular gratuito chamado “Silsila”. As vítimas podem ligar rapidamente para obter ajuda em caso de emergência clicando no botão de pânico, a qual oferece uma lista de centros de crise mais próximos e abrigos para se esconder. Para ajudar a pagar a criação do sistema, a mãe de Manizha vendeu o seu apartamento.
“Acima de tudo, quero que toda essa arte, todas essas músicas, todas as minhas palavras levem a uma lei que proteja mulheres e crianças da violência doméstica”, disse ela ao The Guardian.
Para contribuir na campanha, a cantora lançou um clipe da música “Mama” (em russo e inglês), sobre uma família com um pai abusivo, mostrando o problema da violência doméstica e estatísticas do problema feitos pela sua própria equipe. A agressividade dentro de casa trata-se de um assunto que a Rússia se abstém de combater.
Manizha também apoia ativamente a comunidade LGBT+. No mesmo ano, a cantora participou de um vídeo na revista online queer russa “Otkritiye” (“Open”) durante o Mês do Orgulho. Além de participar do Orgulho Digital de Otkritiye, com a música “Believe” de Cher e no Queerfest em São Petersburgo.Por tudo o que a artista e ativista representa, tornou-se a primeira embaixadora da Boa Vontade da ONU para refugiados, nomeada para a Rússia, em 2020. “Prometo apoiar aqueles que são forçados a fugir de suas casas por causa do conflito e da perseguição, usar minha voz para ajudar os necessitados e esclarecer a situação dos refugiados e apátridas” , disse ela em comunicado.
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Por Carina Gonçalves – Fala! Mack