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O Cinema Brasileiro nos Anos de Ditadura Militar

Por Vinicius Santos – Fala!Cásper

 

“Amanhã vai ser outro dia”, já dizia Chico. Bem, o amanhã chegou, e as pessoas estão pedindo pelo ontem. Como relembrar é resistir, por que não lembrarmos das produções culturais na ditadura? Mais especificamente o cinema, que durante a ditadura civil-militar no Brasil vivia um paradoxo: era financiado pelo mesmo governo que lhe praticava a censura. E como era o cinema brasileiro pré-ditadura?

Em 1955 foi lançado o que é considerado o filme que inaugurou o Cinema Novo: Rio 40 Graus, de Nelson Pereira Santos. O filme não tinha uma história megalomaníaca, a narrativa, os personagens e os cenários eram simples, e focavam em mostrar a cidade que na época era a capital do país.

O Cinema Novo buscava romper com os modelos americanos de contar historias cinematográficas, aproximando-se mais da vanguarda francesa Nouvelle Vague, que defendia um cinema mais autoral, fora dos grandes estúdios e com personagens e imagens mais naturais. Os primeiros filmes desse movimento ainda carregavam muito a estética americana, e apenas no início da década de 60, com a chegada de jovens cineastas, o Cinema Novo ganha um rosto reconhecível.

Os participantes desse movimento eram o veterano Nelson Pereira Santos e os jovens Glauber Rocha, Arnaldo Jabor, Carlos Diegues, dentre outros.

Deste grupo saíram grandes obras como Deus e o Diabo na terra do sol (Glauber Rocha, 1964), Vidas Secas (Nelson Pereira Santos, 1963), adaptação cinematográfica da obra de mesmo nome de Graciliano Ramos, Os Fuzis (Ruy Guerra, 1964) entre outras obras.

Temas como o nordeste e as favelas cariocas eram muito abordados por esses autores, algo que não agradava muito o público comum, que acostumou-se a toda pompa dos filmes americanos.

No ápice da criatividade e produtividade deste grupo, teve início a ditadura militar de 64. Este acontecimento deixou-os extremamente abalados, visto que a maioria dos cineastas possuíam uma ideologia de esquerda.

O filme que evidencia mais essa insatisfação e o sentimento de derrotismo sentido por eles é o filme Terra em Transe (Glauber Rocha, 1967). A obra  narra a história de Paulo, um poeta e político de esquerda, que percebe, tarde demais, servir a líderes oportunistas. Toda a composição do filme, desde a deslinearidade cronológica às imagens alegóricas, os textos desconexos e a despreocupação em contar uma história realista, compunham o que poderia ser uma metáfora para  o abismo histórico do Brasil.

https://www.youtube.com/watch?v=zYQecb9C0g4

O Estado governado pelos militares sabia que não poderia sufocar completamente o cinema, visto que era cercado pela grande indústria cinematográfica de Hollywood, então  começou a apoiar o cinema nacional, mas sempre evitando críticas ao regime, e para isso usavam a censura.

Principalmente depois de 1975, o governo militar passou a financiar obras que não eram necessariamente voltadas para a ideologia que lhes agradava. A Embrafilme, órgão estatal que era responsável por distribuir e produzir filmes, foi uma grande responsável na participação dos filmes nacionais no mercado cinematográfico, conseguindo inclusive inserir os filmes nacionais tanto no mercado nacional quanto no internacional, fazendo-os ter um relativo sucesso.

Neste mesmo período surgiu um movimento chamado Cinema Marginal. As obras que representam o movimento são: O Bandido da Luz Vermelha,de Rogério Sganzerla, Matou a Família e foi ao Cinema, de Júlio Bressane e A Margem, de Ozualdo Candeias.

Estas obras usavam do humor e do grotesco para criar alegorias sobre o estado do país, algo sem futuro e sem perspectiva política. O papel do protagonista não era mais ocupado pelo camponês lutador ou o trabalhador consciente, agora eram os “marginais”, como artistas e os párias sociais; além disso, os heróis não eram mais honrados, eles possuíam uma moral dúbia.

Outra vertente que surgiu nesta mesma época – rejeitada tanto pela censura quanto pelos cineastas de esquerda-, foi a Pornochanchada, feitas com um orçamento muito baixo, em um estúdio improvisado, geralmente com atores que não sabiam atuar, mas possuíam algum atributo físico chamativo. O tema deste novo panorama era a sexualidade, geralmente os plots dramáticos eram: traição conjugal, relação patrão empregada e/ou chefe e secretaria.

Esta vertente foi responsável por adaptar alguns dos contos de Nelson Rodrigues como, Os sete gatinhos(1980), Bonitinha mas ordinária – que possui duas adaptações, uma em 1963 e outra em 1981 – entre outros.

Um cineasta, que nesta época conseguiu mesclar bem os gêneros, foi Bruno Barreto com Dona Flor e Seus Dois Maridos(1976), filme esse que mesclava, humor, erotismo e uma história com peso social que era tratada de maneira mais leve.

https://www.youtube.com/watch?v=OjjUSOQegK4

Quando a ditadura caminhava para seu fim, o cinema nacional começou a criar uma “memória” dos tempos da ditadura. Em 1982 Roberto Rodrigues lançou Pra frente Brasil, filme que mostrava  um cidadão que, ao ser confundido com um terrorista de esquerda, é capturado e torturado pelos militares. O filme não poupa detalhes, sendo o mais realista possível, na época chegou perto de ser censurado, mesmo a ditadura estando em seu fim.

Um gênero muito importante para a criação dessa memória foi o documentário. A partir da década de 80 vários foram feitos com a temática da ditadura e, além disto, também faziam um certo sucesso com o público.

Mesmo com o fim da ditadura, ela continua sendo um período regado de produções audiovisuais, voltadas tanto para manter viva a memória de uma época sombria na história de nosso país, quanto para outros gêneros. Uma certeza é a de que essa memória precisa ser preservada. O passado não deve ser esquecido ou apagado, precisa ser estudado.

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