A cidade de São Paulo retomou uma de suas atividades rotineiras que há tempos não ocorria. No dia 7 de setembro de 2022, data do bicentenário da independência do Brasil, o Museu do Ipiranga foi reaberto ao público – ainda que não para o público geral –, após mais de nove anos fechado para reformas. Enquanto convidados marcaram presença no museu, outras pessoas também se juntaram nos arredores para celebrar a data.
Criado em 1895 para celebrar a História Nacional e a Independência, o Museu do Ipiranga reabriu após reformas de sua estrutura e restauros e inspeções de mais de 3 mil objetos do acervo. Ao todo, as 12 exposições contam com obras, itens e conteúdos interativos. A mais famosa obra é a da “Independência ou Morte”, de Pedro Américo, abrigada no Salão Nobre do museu.
Além de reformas em seu interior, os Jardins Franceses que antecedem a entrada do museu também passaram por restauro e modernização. As duas fontes da entrada do Jardim, presentes no projeto original e retiradas na década de 1970, foram reconstruídas.
A abertura do museu foi dividida em três dias. O primeiro deles (6), foi reservado apenas para autoridades e patrocinadores. O segundo dia (7), marcou a abertura simbólica para estudantes de escolas públicas e trabalhadores da obra de recuperação e suas famílias. Para o último dia da inauguração (8), está prevista a abertura para o público geral.
Uma das atrações, logo na entrada do museu, foi a apresentação de atores representando nomes icônicos da literatura no Brasil. Eles representavam personalidades como os escritores Carolina Maria de Jesus, Mário de Andrade e Cecília Meireles, e o geógrafo Milton Santos.
Museu do Ipiranga: o reencontro da Sociedade
O historiador e curador do Museu Paulista da USP, Paulo Garcez, falou sobre o que representa a reabertura do local, após mais de nove anos fechado para reformas.
O dia é de reencontro da sociedade, com documentos de sua própria história, que narram uma trajetória complexa de mais de 500 anos.
disse o professor
Ele ressalta a possibilidade de fornecer aos novos visitantes uma experiência “muito mais abrangente de visitação”, com cuidados relacionados à acessibilidade e comunicação com diferentes públicos.
Segundo Garcez, também houve um importante trabalho para garantir a presença de “muitos sujeitos históricos, que antes não tinham visibilidade nas exposições”.
Acho que é um reencontro, na verdade, da sociedade, na sua própria diversidade, com um museu que a respeita, valoriza e coloca muitos pontos de interrogação sobre o nosso passado, para continuarmos refletindo.
afirma
Por fim, ele também conta que o principal intuito é que o público “tenha a vontade de voltar e continuar discutindo a história do Brasil”. Garcez cita que um dos elementos pensados para atrair o público foi a criação de uma sala de exposições de curta duração – de 800 metros quadrados – “que permitirá exposições anuais”.
Patriotismo nas ruas
Durante a quarta-feira chuvosa no bairro do Ipiranga, os convidados para a reabertura simbólica do museu puderam prestigiar as mais de 4.500 peças presentes e acompanhar as 11 novas exposições de longa duração, com itens de acervo restaurados.
Fora do perímetro do museu, aglomeravam-se moradores da região, famílias e outras pessoas não credenciadas, que se juntaram em frente aos portões de acesso para tirar fotos e observar a fachada principal.
Foi grande a presença de pessoas com camisas e bandeiras do Brasil. Muitos também demonstravam seu profundo amor ao país. Os entrevistados afirmaram que as camisas do Brasil e manifestações não tinham caráter político.
“Queremos fazer um Brasil melhor! E eu posso gritar do fundo deste meu coração. Brasil que eu te amo: independência ou a morte!”, dizia Arnaldo Birrer, 68, que vestia-se como Dom Pedro I e empunhava uma réplica de sua espada.
É um orgulho estar nesse país que amo, que eu quero, que nunca saí daqui e nunca sairei. Porque não existe país melhor.
falou
Expoentes do amor à pátria, quatro familiares estavam caracterizados como personagens históricos do Período Imperial. Completavam a lista de figuras icônicas Margarida Birrer, 71, representando Teresa Cristina – que foi casada com Dom Pedro II –, Maria Patrício Birrer, 67, que imitava a Princesa Isabel, e Oswaldo Birrer, 64, como Duque de Caxias.
Margarida conta que a atitude foi uma iniciativa própria, “feita de coração”. Para ela, foi uma forma de homenagear tanto o pai – que apesar de suíço ela garante que “amava o Brasil de paixão” – quanto “esse Brasil que amamos tanto”. Ela também afirma ser contrária à vinculação de manifestações dessa natureza com atos políticos.
O que nós amamos é esse Brasil, verde, amarelo, azul e branco. Queremos a paz independentemente de religião ou política. Somos todos irmãos. Queremos nos unir cada vez mais, seja quem for vencer essas eleições, para crescer mais.
disse
O sequestro da data
A reinauguração do museu aconteceu em contexto que especialistas chamam de “sequestro da data da independência”, principalmente por parte do atual presidente da República. No mesmo dia 7 de setembro, Jair Bolsonaro utilizou da data para realizar sua campanha eleitoral, em Brasília.
Bolsonaro já havia convocado os cidadãos para irem às ruas durante a data “em defesa da liberdade” e “pela última vez”, durante o feriado.
Em tentativa de fugir de atos políticos, o governador do estado de São Paulo, Rodrigo Garcia, antecipou o primeiro dia da reabertura do museu para 6 de setembro.
Para Paulo Garcez, o ato de sequestros da independência não é um fenômeno recente.
A apropriação da independência, como um sinal de organização política, é muito antiga. Temos as memórias da independência sendo disputadas entre São Paulo, Rio de Janeiro e Salvador, desde o século XIX. Portanto, esse é um marco político que, na verdade, é compartilhado por todo o país e cada um tenta ‘puxar para o seu lado’.
diz
O historiador ressalta que também cabe aos organizadores do museu universitário discutir as memórias da independência. Nesse sentido, conta que será inaugurada, em novembro, uma nova sala com exposição intitulada “memórias da independência”. O intuito, segundo ele, está relacionado “justamente ao combate em torno de como narrar a independência do Brasil, seus protagonistas e uma história que perdura até os dias atuais e continuará se desdobrando com o decorrer dos anos”.
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Por Leonardo Novaes – Fala! Cásper