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Como os imigrantes têm lidado com a pandemia no Brasil?

A pandemia de Covid-19 afetou toda a rotina e o modo de vida de nossa sociedade contemporânea, nos forçando ao isolamento e ao cumprimento de certas medidas de segurança sanitária. Mas apesar de os efeitos da pandemia terem sido compartilhados por todos os seres humanos, o peso deles na vida de cada um foi desigual, principalmente em certos grupos populacionais.

Os imigrantes, juntamente com outras minorias sociais, foram um dos grupos mais afetados pelo desenrolar da pandemia. Justamente por serem “cidadãos em trânsito”, muitas medidas de contenção tomadas pelos países impactaram a vida deles, como o fechamento de fronteiras.

Vulnerabilidade anterior à pandemia

Cabe ressaltar que a situação de vulnerabilidade social do migrante é anterior à pandemia. O vírus e a falta de ações em favor da proteção dessa parcela da população apenas serviram para transparecer a marginalização dos migrantes no Brasil.

O fato de estar em um país onde não se tem família, não se domina a língua, já põe um indivíduo em uma situação precária. Cabe ressaltar que muitos migrantes chegam ao Brasil sem conhecer seus direitos como migrantes, daí a necessidade das redes de acolhimento.

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Imigrantes retidos na fronteira do Acre. | Foto: Arquivo/Prefeitura Rio Branco.

Refugiados

É impossível falar dos impactos da pandemia na população migrante sem citar o grupo mais vulnerável: os refugiados. O refugiado diferencia-se dos demais migrantes, pois sua migração não é uma simples escolha individual, mas, sim, uma migração forçada.

São pessoas que estão fora de seu país de origem devido a fundados temores de perseguição de raça, religião, nacionalidade, pertencimento a um determinado grupo social ou opinião política, como também devido à grave e generalizada violação de direitos humanos e conflitos armados.

A citação acima é a definição do que são refugiados para a ACNUR (Agência da ONU para Refugiados). Como é evidente pela definição, essas pessoas já vivem em uma situação precária antes mesmo da chegada no país de destino. Muitas delas vêm sem nenhuma reserva financeira e contam apenas com a esperança de uma boa recepção em outro país.

Existem outra série de barreiras que acaba por marginalizar essa população: dificuldade com a língua, documentação, burocracia, não reconhecimento do diploma, entre outras.

Intersecções entre as situações de vulnerabilidade

Mas o grande problema é que a condição de vulnerabilidade do imigrante ou refugiado não costuma estar sozinha, mas, sim, interligada com outras formas de marginalização. Por exemplo, grande parte dos migrantes que chegam ao Brasil vão morar nas zonas periféricas, onde existe a falta crônica de serviços públicos básicos e de assistência.

A burocracia para se conseguir permissão de trabalho ou a própria dificuldade de conseguir entrar no mercado de trabalho brasileiro, seja por diploma não validado ou dificuldade com a língua, leva muitos desses migrantes ao trabalho informal ou autônomo. Nessa modalidade de trabalho, não há qualquer garantia legal dos direitos previstos na CLT.

A pandemia e os migrantes

Com a pandemia, foi necessária a adoção de medidas de restrição de locomoção e o distanciamento social. De certa forma, muitos migrantes já viviam em “quarentena”, basta pensar nos acampamentos de refugiados como locais de confinamento até a obtenção de uma autorização de entrada.

A pandemia foi responsável por escancarar uma série de desigualdades sociais no Brasil e no mundo. E com os migrantes não poderia ser diferente, principalmente se colocarmos outros fatores conjuntamente com a situação migrante, como classe social, raça e gênero.

O maior impacto da pandemia na população migrante, após a questão sanitária em si, foi o impacto econômico. Tendo em vista que muitos migrantes trabalham de maneira autônoma e geralmente não possuem reservas financeiras, o isolamento impossibilitou o “ganha pão” de muitos deles. E assim como muitos brasileiros, os refugiados e migrantes também tiveram dificuldades em conseguir o auxílio emergencial disponibilizado pelo Governo Federal.

Imigrantes como vetores

O início da pandemia com os casos importados criou a necessidade de se fechar fronteiras, ação que tomou cunho político em diversos países. No Brasil, o presidente Bolsonaro, que durante o primeiro ano de seu governo priorizou ou ao menos deu ênfase à questão dos refugiados venezuelanos, por uma simples questão de reforço da narrativa anticomunista, fechou a fronteira com o país vizinho ainda em março de 2020.

No entanto, os casos até aquele momento eram bem baixos na Venezuela, já os cidadãos europeus, permaneciam com entrada liberada ao Brasil, mesmo com o pico de casos na Europa. Além disso, a proibição demonstra a prioridade em impedir a entrada de um grupo de migrantes específico, já que o impedimento aos venezuelanos ocorria através da fronteira terrestre.

Venezuelanos que entrassem por aeroportos brasileiros continuariam permitidos a entrar e ficar no Brasil. Sendo que a rota mais frequente de refugiados venezuelanos é a fronteira terrestre com o estado brasileiro de Roraima. Contudo, o Governo Federal insistiu na narrativa de que as restrições eram sanitárias e não ligadas a fatores ideológicos.

A ideia do migrante como vetor já é bem antiga no Brasil e esteve relacionada a outras epidemias e surtos. No surto de Ebola (2013-2016), que afetou a África Ocidental, os refugiados haitianos que chegavam ao país foram alvos de ataques xenófobos por “possíveis disseminadores do vírus”, mesmo que o Haiti seja um país do Caribe, ou seja a um oceano de distância da zona afetada pelo surto.

Dessa vez, a nível nacional e com aval do Governo Federal, os “vetores” foram os venezuelanos que tiveram sua entrada impedida em nosso país. Contudo, de maneira global, a narrativa foi outra, muitos países e governantes associaram o coronavírus à China, o que desencadeou diversos episódios de xenofobia contra asiáticos e seus descendentes no Ocidente.

Trump e outros líderes de direita, inclusive o presidente brasileiro e sua família, insistiram na narrativa do “vírus chinês”. Meses se passaram e somos nós, brasileiros, que sofremos restrições de entrada por conta do descontrole da pandemia no país.

Necessidade de debater a questão dos migrantes

Com todo o panorama exposto ao longo do texto, fica evidente a necessidade de se debater as políticas públicas para combate da pandemia entre a população migrante. Por exemplo, não é possível ter o número de migrantes infectados ou mortos pela Covid-19, pois o SUS não informa a nacionalidade dos pacientes.

Algumas perguntas podem ser formuladas: com o começo da vacinação, qual o lugar da população migrante ou refugiada na fila? Com a volta dos lockdowns, que tipo de política pública está sendo implantada para assegurar a vida e as condições de sobrevivência dessa população?

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Por Jefferson Ricardo – Fala! UFPE

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