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Provavelmente Você Votará em Branco

Por João Guilherme Lima Melo – Fala!PUC

 

O racismo incrustado nas eleições presidenciais brasileiras

O lançamento das candidaturas por parte dos partidos políticos indica que as eleições presidenciais estão chegando e, seja qual for o seu candidato preferido, ou se ainda não decidiu em quem vai votar, este texto trará uma notícia que pode ser impactante. Provavelmente você votará em branco. Pois é, e isso não tem haver com não quer votar em ninguém por não ter um presidenciável que pense da mesma maneira que você, ou com alguma forma de protesto, esta é uma decisão que está quase que totalmente fora do seu alcance.

Isso deve-se ao fato de que entre os 13 candidatos ao maior cargo do poder executivo brasileiro, apenas dois deles são negros. Ou melhor dizendo, negras. Com a desistência da candidatura do ex-presidente do STF (Superior Tribunal Federal) Joaquim Barbosa, que disputaria as eleições representando o PSB, a população negra terá como representantes nesta disputa pela presidência Vera Lúcia do PSTU, e Marina Silva, do Rede Sustentabilidade.

Vera Lúcia no lançamento da sua candidatura à presidência (Reprodução: Romerito Pontes/PSTU)

  

Mas infelizmente esta perspectiva quanto à eleição de presidentes negros não restringe-se somente ao vigente processo eleitoral. Se atentarmos para os candidatos à Presidência da República deste século, podemos perceber que a falta de representatividade negra em cargos de liderança é algo de fato estrutural. Em 2002, as eleições tiveram seis presidenciáveis, e compondo este grupo de políticos não havia NENHUM negro(a). Na ocasião, o escolhido para exercer o cargo de presidente do Brasil foi Luiz Inácio Lula da Silva

No ano de 2006, as campanhas eleitorais tiveram um candidato a mais do que nas eleições anteriores, mas, diferentemente do que ocorreu no ano do pentacampeonato mundial da seleção brasileira de futebol masculino, a população negra teve um representante. Uma representante. Foi a alagoana Heloísa Helena, do PSOL. Heloísa foi uma das fundadoras desta legenda, e a sua iniciativa de criar o partido ocorreu após ela ter sido expulsa do PT. Ela foi, inclusive, em 2005, eleita a mulher mais influente na política brasileira, em votação promovida pela revista Forbes. Primeira senadora eleita pelo estado do Alagoas, Heloísa não chegou a disputar o segundo turno das eleições vencidas novamente por Lula.

Heloísa e Marina no lançamento do partido Rede em 2013 (Reprodução: Sergio Lima/Folhapress)

 

Em 2010, nove candidatos disputaram o cargo político brasileiro mais importante, e novamente a comunidade negra carecia de semelhantes nesta disputa. Houve uma “substituição”: ao invés de Heloísa Helena, a representação estava centrada no nome de Marina Silva, do PV. Ministra do Meio Ambiente de 2003 a 2008, a acreana ficou na terceira posição da corrida eleitoral em questão, ficando atrás de José Serra (PSDB) e Dilma Rousseff, presidenta eleita defendendo o PT.

No ano de 2014, podemos dizer que houve uma repetição de fatos nas eleições. Marina Silva novamente foi a única candidata negra, alcançando, assim como em 2010, a terceira colocação neste processo, mas desta vez representando o PSB. Além disso, após disputar o segundo turno com Aécio Neves, do PSDB, Dilma foi reeleita presidenta do Brasil pelo PT.

Consequentemente, assim como na questão das candidaturas, a efetivação de negros como presidentes do Brasil também é algo preocupante. Ao longo da história, há registros de que até quando conseguiram alcançar o mais importante cargo executivo brasileiro, os presidentes negros tinham dificuldade para assumirem-se como tais. Como um dos exemplos, podemos citar o carioca Nilo Peçanha (1867-1924), que foi presidente de 1909 até 1910, assumindo tal posição após a morte do então presidente Afonso Pena. Dado o contexto da recente abolição da escravidão no Brasil (que ocorreu em 1988), Nilo era frequentemente ridicularizado pela imprensa da época por conta da cor da sua pele, sendo este um dos fatores que levaram os responsáveis pelos cuidados de sua imagem a retocarem seus retratos para que ele não fosse interpretado como negro.

Presidente Nilo Peçanha

                                              

Além de Nilo Peçanha, há registros que dizem que Rodrigues Alves (1848-1919) e Washington Luis (1869-1957) também foram presidentes que tiveram a sua identidade disfarçada por conta de preconceitos da época, mas que como sabemos, continuam existindo até hoje. Rodrigues Alves comandou o país de 1902 até 1906, enquanto Washington exerceu o cargo de presidente entre 1926 e 1930, e ambos eram ditos como brancos por terem uma posição social elevada.

É, as informações apresentadas ao longo deste texto reafirmam a ideia destacada no seu início: provavelmente você votará em branco. Mas mais do que isso, o conteúdo trazido demonstra que nós, brasileiros, quase sempre votamos em branco no decorrer da história. E esta ausência histórica de negros em cargos de liderança no Brasil é só mais um exemplo que reforça a ideia do racismo estrutural que limita o desenvolvimento da sociedade brasileira.

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