Sem gerar surpresas, os filmes de Hollywood da primeira metade do século XX passaram a ser encarados como um meio promissor de propagar comportamentos e ideais de uma sociedade em ascensão – um modo de dominação mais abrangente do que o militar. Após a Segunda Guerra, uma nova liderança mundial emergiu sob os escombros de uma Europa destruída. Em pouco tempo, os Estados Unidos se tornaram, além da potência bélica, um modelo de sociedade a ser seguido, o padrão do sucesso.
A história norte-americana sempre esteve muito ligada à religião, e a ideia de que se deve trabalhar, prosperar e promover o progresso dentro da própria comunidade. Além disso, com a chegada da Segunda Revolução Industrial, há um estímulo maior ao consumo devido à modernização dos meios de produção, é nesse contexto que surge o american way of life – conceito atrelado ao consumo e a um padrão de família, de beleza, de gênero, de normas e de regras que se deve ter para ser bem sucedido.
Pós-Segunda Guerra Mundial e o papel dos filmes estadunidenses
Devido à conjuntura do período pós-Segunda Guerra, quando os EUA assumiram a função de reconstruir parte do ocidente, o país passou a ter mais visibilidade e todo o mundo passou a enxergá-lo como um líder a ser seguido. Ao mesmo tempo, o cenário era favorável para os meios de comunicação – através principalmente do cinema e da TV – influenciarem e entrarem na vida das pessoas.
Com o poder de distribuição dos EUA, os filmes foram levando esse modelo de vida a outros países. Dessa forma, os norte-americanos tiveram a imagem de seu país sendo retroalimentada por essas obras cinematográficas, ao passo que essas mesmas obras foram construindo essa mesma imagem (muitas vezes idealizada) pelo mundo.
As informações sobre esse modo norte-americano de estar no mundo, de viver a vida, sua maneira de encarar problemas, suas soluções para eles, seu modo particular de alcançar a felicidade e o próprio conceito de felicidade, eram dadas tanto no roteiro dos filmes, nas falas dos personagens, em suas atitudes, como também na própria organização da imagem exibida, nos enquadramentos, na montagem, na mise-en-scène.
Além disso, a confiança na democracia e na iniciativa individual, a crença de que a nação estadunidense triunfaria sobre a hipocrisia, o egoísmo e a corrupção dos políticos e magnatas eram temas abordados nos filmes.
Os filmes norte-americanos
Na obra cinematográfica O Mágico de Oz (1939), elementos de exaltação da ordem, da racionalidade e do método, constituintes do american way of life, aparecem com especial destaque. No filme, o mundo de Kansas foi moldado como ‘lar’ pelo uso de formas simples e descomplicadas.
Em Os Três Porquinhos, desenho animado de Walt Disney (1933), a exaltação do trabalho duro, feito com determinação e foco, tem grande presença. Enquanto dois dos porquinhos constroem casas de palha e madeira, de modo displicente, cantando e dançando, o terceiro constrói sua casa de alvenaria, ciente da importância de seu trabalho e diz: “construo minha casa de pedras, construo minha casa com tijolos. Não tenho oportunidade de cantar e dançar pois trabalho e diversão não se misturam”. Assim, ele deixa claro ter feito sua opção pelo trabalho sério enquanto os outros continuavam a cantar e a dançar.
Elementos presentes nos filmes
O otimismo está presente em inúmeras produções hollywoodianas da década. O próprio happy end, indispensável ao final de cada filme, tem uma mensagem clara de que não importa o que tenha acontecido, o final será sempre feliz, explicitando o otimismo fundamental ao american way of life, um otimismo ingênuo e determinado em seus objetivos.
O individualismo também foi presença constante nos filmes hollywoodianos do período. Há desde os filmes de gângster, bastante populares naquela década, que apesar de reservarem uma punição trágica e exemplar para seus personagens principais, não deixava de retratar a ascensão social de indivíduos que, via de regra, oriundos das classes mais populares alcançavam o sucesso e a fortuna. Até filmes, como Rua 42 (1933), Irene, a Teimosa (1936) e As Aventuras de Robin Hood (1938), em que personagens individuais têm nas mãos o destino e a felicidade de um grande número de pessoas.
Finalmente, temos o consumismo como traço do american way of life presente nos mais diferentes filmes hollywoodianos da década de trinta. Em Tarzan, O Homem Macaco (W. S. Van Dyke -1932), Jane chegava à África para visitar o pai, o comerciante James Parker, vinda diretamente de Londres e, depois de instalar sua bagagem numerosa na cabana do pai, ela começava a passar um creme no rosto para depois removê-lo com um lenço. Durante esta ação, que é mostrada com a atriz Maureen O’Sullivan (Jane), olhando diretamente para câmera – como se esta fosse seu espelho – ela e o pai – que a observa ao fundo do quadro – travam um diálogo em que ela pode falar a ele (e ao público) sobre as vantagens do uso de cremes faciais.
Em suma, na produção cinematográfica norte-americana, é evidente a construção da identidade de defensores da democracia e justiça, reconhecedores do esforço atrelado ao consumo, que ganhou o mundo principalmente após a Segunda Guerra Mundial e tornou-se o padrão do capitalismo global.
Cenários
Ambientados em cidades como Nova York, São Francisco, Hawaii, Los Angeles, Texas, Washington DC, Miami, Boston, Detroit, Las Vegas, além das praias da Califórnia, estes cenários, muitas vezes, são valorizados nas produções e assumem um papel de protagonismo, como se a cidade fosse realmente um personagem. Isso contribui cada vez mais para a popularização dos Estados Unidos ao redor do planeta.
De mais a mais, roupas, acessórios, veículos de transporte, bens materiais, produtos consumidos e lugares frequentados pelos personagens dos filmes criam um estereótipo do norte-americano, que muitas vezes é copiado pelo público do filme, colaborando, portanto, para a popularização do país devido ao – entre outros motivos – surgimento de uma vontade de seguir esse estereótipo à risca para uma maior aceitação.
O domínio de Hollywood nos mercados mundiais de cinema
Os filmes norte-americanos são exportados para todo o mundo e as companhias de mídia são proprietárias e operadoras de canais de mídia também em outras partes do globo terrestre.
Filmes de franquias
Além disso, ao seguir a linha de raciocínio do consumismo norte-americano, os grandes estúdios vêm investindo cada vez mais em franquias que têm o potencial de permanecer populares durante muitos anos, possibilitando a venda de outros produtos – como roupas, brinquedos e até mesmo ingressos para parques temáticos, a exemplo temos o sucesso da série de filmes Harry Potter, que teve como consequência a construção do The Wizarding World of Harry Potter localizado em Orlando, nos Estados Unidos, o que permitiu assim uma ampliação indireta da popularização do país, que atrai muitos turistas.
Isso sem levar em consideração os parques temáticos do Walt Disney World Resort – o resort de entretenimento mais visitado no mundo, que recebe aproximadamente cerca de 93 milhões de visitantes por ano. Como o Walt Disney Studios está sempre lançando filmes novos, atrações e produtos inéditos nunca estão em falta, o que atrai sempre mais turistas aos parques, e consequentemente ao país.
Assim, sendo os Estados Unidos o país de maior poderio político, econômico e cultural mundial, e detentor de uma população patriota, não é surpreendente o fato de seus filmes contribuírem para a popularização do país.
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Por Giulia Lang – Fala! Cásper