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Compreenda os nós e paradoxos existentes na 2ª temporada de ‘Dark’

Dark retorna para sua terceira temporada na Netflix. A série foi considerada uma das mais complexas de toda a plataforma e, talvez, de todas as séries já produzidas nos últimos tempos. Com uma narrativa fragmentada semelhante a Lost e com uma ideia similar de tempo ao do filme A Chegada, ela confunde seus fãs de uma maneira positiva.

O vai e vem da história deve ser analisado cuidadosamente, pois cada detalhe pode fazer diferença na compreensão da narrativa, já que estamos trabalhando com diversas linhas do temporais que ocorrem em um mesmo período.

terceira temporada de Dark
A terceira temporada de Dark já está disponível na Netflix. | Foto: Reprodução.

Relembre a primeira temporada

A primeira temporada de Dark se assemelha a um palco, ela nos apresenta a viagem no tempo e as ligações existentes entre suas personagens, que se conectam no passado e no futuro ao longo dos 10 episódios.

A história tem como foco do enredo o desaparecimento de garotos na cidade de Winden, na Alemanha, algo que ocorre há 66 anos. Além disso, temos Jonas, um garoto que sofre com o suicídio de seu pai. Com o decorrer da série, a possibilidade de viagem no tempo nos é apresentada, e descobrimos que um dos garotos desaparecidos, Mikkel, é o pai de Jonas, e que ele teria desaparecido em 2019 e reaparecido em 1986.

A narrativa se constrói dessa maneira a partir do desaparecimento de Mikkel com diversos lapsos no tempo. Ulrich, pai do garoto desaparecido, viaja em busca de seu filho, mas acaba em 1953, 33 anos antes do tempo em que o garoto foi parar. Jonas viaja para 1986 e encontra Mikkel, mas é impedido de retornar com ele, pois isso mudaria o curso da história.

Vale lembrar que todos viajam no tempo através de uma caverna, localizada próxima a Usina Nuclear de Winden. O que permite essa viagem é um buraco de minhoca que se abriu após o acidente nuclear em 1986. A data do acidente corresponde a mesma da Usina de Chernobyl, e é de acreditar-se que é proposital.

Outro personagem que parece ser fundamental naquele momento é Noah, um suposto vilão, que sequestra meninos em diversas épocas. Na série, ele se apresenta na figura de um padre e diversas vezes o roteiro dá a entender que ele seria o anticristo.

Ao final da temporada, Ulrich permanece em 1953, Mikkel em 1986 (o garoto é adotado pela enfermeira Inês Kahnwald e se torna Michael Kahnwald, pai de Jonas, que, futuramente, morre) e Jonas, ao passar pela porta da caverna, é transportado para 2052, um ano que até então é desconhecido na série.

Todas essas histórias estão ligadas de alguma maneira e em algum momento. Os vínculos são importantíssimos para a compreensão. A temporada reforça a ideia de que o tempo não é linear, mas sim, cíclico, e que passado e futuro se impactam diretamente, a mensagem necessária para compreender o que vem a seguir.

A segunda temporada e seus paradoxos

Na temporada seguinte, a história começa a se construir e ser explicada, diversas relações passam a fazer sentido para o público. Somos apresentados a novos personagens, como Adam, o verdadeiro vilão da trama, e não Noah como acreditávamos até então.

Jonas, que no último episódio da primeira temporada vai parar no ano de 2052, descobre que o futuro é catastrófico após um apocalipse em 2019, causado pela matéria escura que se formou com os resíduos do acidente nuclear na Usina de Winden. Esse mundo pós-apocalíptico é controlado por Elisabeth Doppler, a garotinha surda-muda de 2019, agora adulta. O garoto é capturado por ela, mas, com a ajuda de uma integrante do grupo de Doppler, Jonas foge e encontra a matéria escura que ainda se encontra nos destroços da Usina. Por meio dela, sai do ano de 2052 e regressa para 1921.

Nesse novo ano, Jonas conhece a versão jovem de Noah e Adam, líder de um grupo que se denomina como Sic Mundus. Assim, o jovem descobre que Noah (até então um suposto anticristo) trabalhava para esse grupo. O novo vilão explica para o jovem a respeito dos ciclos existentes e que é necessário quebrar esses ciclos para se libertarem. Ele revela ter criado uma outra matéria escura que permite viajar para qualquer momento e, com isso, criar um novo mundo. Mas a maior revelação é de que Adam é a versão mais velha de Jonas.

Outro detalhe revelado é a razão pela qual Noah trabalha para Adam, supostamente o vilão teria pego sua filha e levado a criação para outro tempo. Ao final, descobrimos que Charlotte Doppler é a filha perdida de Noah, e mais, sua mãe é Elisabeth Doppler, ou seja, sua filha.

Para compreender isso, é necessário ter em mente de que Noah viaja no tempo há anos e que, em algum momento, encontrou Elisabeth adulta, que engravidou e teve um bebê. Essa criança foi roubada deles por Adam, que a deixou no passado, nas mãos do inventor H.G. Tannhaus. Charlotte cresceu no passado, casou e teve duas filhas, uma delas é Elisabeth que cresceu, se relacionou com Noah e teve uma filha, que foi roubada e levada para o passado. A ideia se assemelha com o que aconteceu com Mikkel Nilsen.

Ao fim da segunda temporada, a grande maioria das personagens descobriu de alguma maneira a respeito da viagem no tempo e, até mesmo, já fez alguma viagem. Como, por exemplo, os irmão Nilsen, Magnus e Martha, que viajam por meio da máquina inventada por Tannhaus. Os irmãos retornam a 1986, e chegam a ter um encontro com o pai deles já mais velho. Vale lembrar que Ulrich Nilsen, pai dos garotos, voltou para 1953 na tentava de encontrar o filho, foi preso e envelheceu naquela época. Então, em 1986, tínhamos duas versões de Ulrich, o adolescente pertencente àquela época e o senhor que envelheceu.

No último episódio, todos os personagens que possuem o conhecimento do apocalipse que se aproxima vão para 2019, para evitar ou causar que o acidente ocorra. A versão adulta de Jonas, que conhecemos na primeira temporada e que é o responsável por revelar a verdade para o adolescente que tenta resgatar Mikkel de 1986, tenta salvar a vida de Martha e de outro, levando-os para um bunker. Sua versão mais velha está disposta a impedir a catástrofe que está por vir. Enquanto isso, sua versão mais nova, que já conheceu Adam e que se juntou com Claudia Tiedemann, tenta impedir os Sic Mundus de mudar o tempo e construir um novo mundo.

final de Dark explicado
Dark chega ao fim com sua terceira temporada. | Foto: Reprodução.

No fim, a versão adulta de Jonas não consegue realizar o que queria, sua versão mais nova encontra Martha e Adam mata a garota na frente de Jonas, alegando que é a dor da morte que irá transformar Jonas no que Adam é. Mas algo que não parece estar planejado acontece, uma versão da Martha surge na sala, surpreendendo ambos. Jonas questiona de que ano ela é, e a garota afirma que não de um ano, mas sim, de um mundo.

O fim de Dark abre portas para a existência de multi-versos, ou seja, mundos que existente paralelamente uns aos outros, com as mesmas pessoas vivendo versões de si diferentes. Isso também abre para a possibilidade do plano de Adam ter dado certo, e ele conseguiu criar seu outro mundo.

Ao longo da série, diversas referências científicas e bíblicas são citadas, como o próprio nome de Adam, que se refere a Adão, personagem bíblico expulso do Paraíso. Já a parte científica, pertence a todo o conceito de viagem no tempo e múltiplos universos, o que torna tudo complexo para aqueles que acompanham.

As teorias utilizadas para a construção do roteiro são todas exemplos físicos, teorias como o Paradoxo de Boostrap e o Bóson de Higgs. Conhecê-las é o primeiro passo para tornar tudo mais fácil.

Paradoxo de Boostrap

Conhecido também por Paradoxo Ontológico, é um paradoxo de viagem no tempo em que as informações ou objetos podem existir sem terem sido criados, ou seja, o objeto ou informação que é enviado no tempo se torna o objeto/informação de início, que viaja no tempo, conectando passado e futuro.

Esse paradoxo explica um fenômeno recorrente na série, personagem do futuro ou passado, que viajam para outro tempo e são responsáveis por acontecimentos específicos daquela época. Por exemplo, Claudia, que retorna a seu tempo para salvar o seu pai e acaba sendo a responsável por sua morte. Charlotte Doppler ser a mãe de sua mãe, e Mikkel Nilsen existir em um mesmo tempo que seu eu futuro, Michael Kahnwald, e de seu filho Jonas Kahnwald.

Compreender essa teoria é compreender que todo personagem da série possui sua relevância em outro tempo, cada viagem que ocorre sendo para o futuro ou para o passado influência no decorrer da narrativa. Esse detalhe está presente desde a primeira temporada, quando somos apresentados à cidade de Winden, na Alemanha, um lugar em que passado, presente e futuro se encontram.

Bóson de Higgs

Essa teoria é recente na série. Foi nos apresentada por Adan, que a chama de Partícula de Deus. O Bóson de Higgs é uma partícula elementar do Modelo Padrão de partículas, que teria surgido após o Big Bang. Ela explicaria a existência e a falta de massa nas partículas elementares. Foi predita pelo físico Peter Higgs, que trabalhou baseando-se nas ideias de Philip Anderson. Ficou conhecida popularmente como a Partícula de Deus, que seria uma alusão a ela permitir a existência ou a falta de massa em outras partículas. Esse nome teria sido atribuído após o livro de Leon Lederman, que após se frustrar com seus estudos a respeito, deu o nome de sua obra como “a partícula maldita”. Porém, por razões comercias, o nome foi modificado.

Bóson de Higgs de Dark
Bóson de Higgs, de Dark. | Foto: Reprodução.

Na trama, essa suposta partícula seria semelhante a uma matéria escura, que permitirá a viagem no tempo para qualquer momento, quebrando, assim, o ciclo de 33 anos apresentado inicialmente.

A primeira matéria é criada com o acidente da Usina Nuclear de Winden em 1986, os dejetos do local formaram essa massa que ficou pressa no subsolo, sendo liberada em 2019 e causando o fim o ciclo. A segunda teria sido criada pelos Sic Mundus e permitiria viajar para além do tempo de 33 anos. Teorias afirmam que essa massa escura é a responsável pelo funcionamento da máquina do tempo utilizada pela Martha do outro mundo.

Dark é uma série complexa, mas possível de se compreender. Prestar atenção é o ponto chave para que a narrativa construída em camadas faça sentido. O segredo é entender que existem anos diferentes e que todas as versões de uma pessoa podem transitar por eles, e existir juntas em um mesmo tempo.

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Por Luiza Nascimento Lopes – Fala! PUC

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