Falar de indústria musical, leva-nos a refletir sobre a origem de cada elemento que resultou no que se é contemporâneo. Dentro de uma Dialética, quais as sínteses e antíteses, que se confrontaram para formar a tese – a música – e de que forma essa fomenta uma disputa dentro de sua produção, para que a cada dia se supere.
E como a cultura é um retrato claro do que é a história de uma civilização, em um planeta globalizado, certos artistas ditam as andanças do mundo, influenciando não só seu setor de atuação. Dessa forma, é de se esperar que no mundo, onde o racismo está enraizado de maneira profunda, a primeira arte, ecoe de tal maneira.
Mas, para nossa sorte, assim como em todos os âmbitos, o homem preto se fez resistência também no meio musical e, sendo resistência, muitos tornaram-se referência e, por isso, pode soar injusto listarmos apenas 5. Todavia, torna-se necessário para que se identifique pilares de estilos e momentos e, essencialmente, a luta.
5 artistas negros que revolucionaram a música
Sister Rosetta Tharpe
Toda história tem partida em um ventre materno e, com o Rock ‘n’ Roll, claro que não seria diferente. Sendo assim, é preciso que comecemos pela mãe do provável mais ativista dos gêneros. Sim, isso mesmo, antes mesmo que lendas, como Slash e Eric Clapton, nascessem, uma mulher preta, dominava sua Gibson SG branca.
Nascida em 1915, Sister Rosetta Tharpe, obviamente, vivia em uma época onde não se era permitido que muitas mulheres tocassem guitarra. Assim, seu primeiro acesso se deu graças à Igreja e, a partir dessa, sincretizada com suas inspirações afroamericanas, do Blues e do Jazz, iniciou-se uma mistura de músicas sacras, com temáticas relacionadas ao pecado, que embalavam danças sensuais e, por conseguinte, foi extremamente criticada… mas qual revolucionário, não é?
Acredita-se que seu legado, tenha sido maior que os críticos (presença de tom irônico). Em 1944, lançou a música Strange Things Happening Every Day, considerada a primeira gravação da história do Rock ‘n’ Roll.
Chuck Berry
“Se você der outro nome ao Rock ‘n’ Roll, você deve chamá-lo de Chuck Berry”. Evidentemente, a citação que nos introduz a tal lenda pode resumir tudo que, aqui, você venha a ler e que deveria ser apresentado a certos grupos racistas, que acham que são rockeiros (nem gente são). Ficaria de bom tamanho, para que entedessem quão grande ele foi se apresentasse a vocês, clássicos, como Johnny B. Goode, Roll Over Bethoven, Maybellene, Sweet Little Sixteen e School Days.
Mas, talvez, não fosse correto com sua obra, apenas mostrar, que ele tocava sobre vida na escola, carros velozes e romances adolescentes. É importante lembrar da decisão da Suprema Corte americana no caso Brown vs Conselho de Educação (1954), que tornava inconstitucional a segregação racial nas escolas, entre tantos outros adventos da luta contra a segregação e, claro, Chuck Berry, era o homem que fez que “a música dos negros” fosse aceita e, mais que isso, seu Rock, salvou o Rádio de uma morte certa, já que, com a televisão, esse se tornava obsoleto. E, por mais que as instituições tentem tornar (até hoje), o Rockabilly algo ”branco”, suas raízes são de pretos marginalizados e… revolucionários.
Jimi Hendrix
Quando alguém com 27 anos falece, os pensamentos geralmente são ”tinha tantos planos, não conseguiu viver nada”. Porém, esse pequeno espaço de tempo, foi suficiente para que se perpetuasse o maior guitarrista de todos os tempos, Jimi Hendrix.
E, nesta introdução, vou aproveitar para fazer menções honrosas a dois que poderiam receber parágrafos, nessa matéria, pois Jimi iniciou sua carreira nas bandas de apoio de BB King e Little Richard. Falando do ”Deus da guitarra”, só seu album Are you experienced? já seria suficiente para ele estar nessa lista, mas é dever moral e ético, citar a maior revolução cultural, que o Rock proporcionou a humanidade, Woodstock, e se esse foi o grande festival, o grande momento foi Hendrix tocando o Hino dos Estados Unidos, com menos uma corda, levando o público à loucura (não que esse já não estivesse em tal estado) e, em seguida, fechando com Hey Joe, foi um sonoro e poderoso protesto contra a Guerra do Vietnã.
Beyoncé
Dando um salto de algumas décadas e certamente, cometendo algumas injustiças de nomes não citados, é fundamental enxergar que a revolução não acabou e, para isso, precisamos falar de alguém contemporâneo. E nada mais justo do que falar do álbum que revolucionou a Indústria fonográfica e, sim, estou falando de Beyoncé que, por acaso, também é o nome da artista em questão.
Imaginem como um romance. Era 13 de dezembro de 2013 e o mundo vivia de modo habitual, até que do ”anti-marketing” emerge o termo ”álbum visual”. Antes disso, o artista anunciava o álbum com vários meses de antecedência.
Após o lançamento de Beyoncé, os artistas passaram, na maioria das vezes, a divulgar e lançar o seu single horas antes de ser disponibilizada nos serviços de streaming (acho que isso que define revolução, certo?). A icônica frase da diva: “eu vejo música”, expressa bem o que foi feito, todas as faixas possuíam clipes, com produções que parecem ser tão importantes quanto a própria música. E, por mais que tudo isso tenha sido uma grande surpresa, surpreendendo um total de zero pessoas, a cara de tal revolução é de uma mulher… preta.
Ivone Lara
E, para finalizar, creio ser apropriado mencioarmos algum grande artista brasileiro e, acredite, são muitos. Do choro ao Funk, a música dos marginalizados tornou-se o que todos querem ouvir e nada descreve melhor isso que ”é som de preto, de favelado, mas, quando toca, ninguém fica parado”.
Dessa forma, não foi fácil escolher um nome, mas já que estamos em um meio de revolução, temos que falar da Primeira Dama do Samba, Dona Ivone Lara. A Rainha do Samba é o grande pilar, tanto para os pretos, mas principalmente para as mulheres.
Para que compreenda, ela lançou seu primeiro disco ao 56 anos e qual o grande motivo desse reconhecimento tardio? É claro, o machismo. Não havia a menor abertura para mulheres se apresentarem nos terreiros das escolas de samba e cabia a uma preta mudar essa história (revolução que fala?).
No começo, ela apresentava suas obras como se fossem de seus primos, Mestre Fuleiro e Tio Hélio. Até que, de maneira pioneira, em 1965, com Os cinco bailes da história do Rio, pela Império Serrano, ela se tornou a primeira mulher a entrar em uma ala de compositores e vencer a disputa de qual samba-enredo a escola levará para avenida. E, assim, abriu espaço para tantas, como Alcione, Jovelina Peróla Negra e Leci Brandão.
Por fim, apesar da carne mais barata do mercado continuar sendo a carne negra, todos continuam querendo imitar seus cabelos enrolados, sua música, a tal “Jimi experience”. E, mesmo não vivendo no tal Wonderful Word (mundo maravilhoso, em tradução), idealizado por Louis Armstrong, ou mesmo chegado no sonho de paz e amor de Bob Marley, entre Emicidas e Elzas, Reies e Whitneies, um sorriso negro sempre estampará a resistência.
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Por Guilherme Gonçalves – Fala! UFRJ