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Opinião: O 13 de maio, a resistência e a exclusão dos negros no Brasil

Em 1888, a Princesa Isabel assinou a Lei Áurea que abolia a escravidão do Brasil. Este longo e gradativo processo foi fruto, não da vontade genuína da Princesa de libertar os escravos, mas porque o Brasil passava por fortes pressões de Estados europeus que, com a Revolução Industrial, procuravam lucrar com seus produtos e, portanto, precisavam de mais gente para comprar suas mercadorias. E foi também, sobretudo, resultado de intensas lutas de comunidades negras e dos escravos, que desde o trajeto nos navios negreiros procuravam maneiras de resistir à “autoridade” portuguesa.

O processo lento e gradativo da abolição

As formas de resistência praticadas pelos escravos poderiam se dar de diversas maneiras: através do suicídio, do aborto para impedir que seus filhos nascessem escravos, por meio de rebeliões, se fingir de doente e até mesmo na forma de infanticídio. Mas, sem dúvida, a forma mais famosa de resistência que se tem notícias foram os quilombos, comunidades negras (que também funcionavam de refúgio para não negros que passavam por uma situação de miséria) que protegiam os escravos fugitivos e comandavam rebeliões aos engenhos e seus senhores.

Ao longo das décadas, a pressão do movimento negro foi aumentando e, aos poucos, leis foram sendo criadas para apagar a chama da rebelião. Umas das primeiras leis a serem criadas foi a lei que proibia o tráfico de escravos em 1831, mas que não foi cumprida pelo governo, mas que em 1850, com a Lei Eusébio de Queiroz, essa regra foi oficializada, ainda que a prática continuasse clandestinamente.

Em 1871, promulgou-se a Lei do Ventre Livre e, em 1885, a Lei do Sexagenário. E em 1888, a Lei Áurea, que sanou um problema dentre os vários enfrentados pela população negra do Brasil.

Sociedade pós-abolição

A Lei Áurea traz à tona um projeto de exclusão e de marginalização de ex-escravos, já visto em 1850. Nesta data, a lei de terras entrou em vigor, lei em que você só podia possuir uma terra se a comprasse.

O problema começa aí: sem condições financeiras, ex-escravos não conseguiam possuir terras e eram forçados a fazer de tudo para sobreviver, alguns até mesmo voltaram para os engenhos onde eram escravizados para trabalhar, em troca de abrigo e comida. Sem um espaço no campo, foram forçados a irem para as cidades, onde enfrentaram problemas de falta de emprego, violência e condições sanitárias precárias. 

As formas de exclusão e de violência contra os negros não cessaram, assim como as lutas de resistência também não. Em 1910, por exemplo, João Cândido liderou a Revolta da Chibata, em que marinheiros negros se rebelaram contra os maus tratos sofridos nos navios onde trabalhavam.

Como pode-se observar, a lei da abolição, apesar de dar liberdade jurídica aos ex-escravos, não se esforça em integrá-los à sociedade e nem garante a proteção desses indivíduos, criando uma raiz histórica turbulenta que podemos observar até os dias atuais.

escravidão 13 de maio
Muitos negros continuam sendo marginalizados no Brasil, apesar da abolição da escravidão. | Foto: Reprodução.

Como se configura a situação da comunidade negra na atualidade?

A comunidade preta, principalmente a preta periférica, ainda enfrenta muitas dificuldades, que são resultado desse passado histórico obscuro. Ano passado (2019), 75% dos mortos pela polícia foram pretos e pretas, segundo um estudo do Fórum brasileiro de Segurança Pública.

A polícia militar e a milícia brasileira atuam com frequência dentro das favelas e matam centenas de inocentes, em sua maioria negros, todos os anos. Lembremos dos irmãos Victor Hugo e Roger dos Santos Silva, de Ágatha Vitória, Kauan Peixoto…as mortes estão se tornando banais e mostram a realidade que se quer contar pela elite brasileira, de criminalização da sociedade preta.

A taxa de feminicídio também é maior dentre as mulheres negras: tomam a frente 65% dos casos em relação às mulheres brancas. Além disso, em 2019, ultrapassaou-se, pela primeira vez, os números de negros em universidades públicas: 50,3% dos estudantes eram pretos e pardos. Entretanto, cerca de 55,8% da população brasileira é formada por pretos e pardos, ou seja, esse número ainda é bastante inferior ao desejado.

Em abril deste ano, os números de negros e negras mortos em decorrência da pandemia do coronavírus quintuplicaram, revelando o descaso dos órgãos públicos e do governo com as condições precárias que maioria da população negra sofre no Brasil.

Apesar de libertos, pretos e pretas ainda não estão nem perto de serem livres da injustiça, violência e do lugar de ignorância no qual são colocados.

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Por Paulo Matheus – Fala! Universidade Federal Rural de Pernambuco

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