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A importância do ‘Setembro Amarelo’ em todos os meses do ano

 A importância da prevenção e a posvenção do suicídio, ou seja, qualquer ato apropriado e de ajuda que aconteça após a tentativa de suicídio com o objetivo de auxiliar os sobreviventes a viver mais, com mais produtividade e menos estresse que eles viveriam se não houvesse esse auxílio. 

Setembro Amarelo suicidio
Izabela Guedes. Foto: Amanda Dutra

O Luto e o Cuidado

Desde 2015, a Campanha do Setembro Amarelo — inspirada no Dia Internacional de Prevenção do Suicídio, comemorado no dia 10 — busca a conscientização da causa.

Uma palestra de Sobreviventes do Suicídio ocorrida na PUC-Rio, propociou uma experiência de acolhimento debateu a dor e as problemáticas vividas pelos parentes de pessoas que morreram em decorrência de suicídio, chamados de sobreviventes.

A mesa foi mediada pela coordenadora do Laboratório de Estudos em Família e Casal (LEFaC/PUC-Rio) Andrea Seixas Magalhães. O debate teve a presença de Ivo Oliveira Faria, palestrante sobre suicídio, e de Izabela Guedes — do grupo de Psicoterapia para pessoas enlutadas (LELu / PUC-SP).

De acordo com a OMS (2010), a taxa de suicídios aumentou 60% nos últimos 45 anos e a projeção para 2020 é o aumento de mais de 50% desses casos.

Na palestra, foi apontado que o ato não deve ser entendido como consequência de uma única causa, porque é um fenômeno que envolve vários fatores, entre eles, biológicos, psiquiátricos, sociais, psicológicos, econômicos, religiosos, ambientais e culturais. 

Integrante do grupo de Psicoterapia para pessoas enlutadas (LELu/PUC-SP), Izabela Guedes discorreu sobre o pensamento da sociedade sobre do suicídio. Para ela, o estigma e a culpa são temas recorrentes quando se lida com a complexidade do luto. 

— A ideia de cometer suicídio vem mudando, porque vem de cometer crime. Esse ato já foi chamado de auto assassinato. As pessoas entendem que essa palavra traz muito estigma para a família, porque é comum que busquem culpados quando suicídio acontece.

Em geral, culparão a família, a escola, o término de namoro, como se se fosse o fato isolado que faz a pessoa tirar a própria vida. É preciso notar que não tem como analisar isoladamente para saber o que teve mais força para levar a pessoa ao suicídio, porque os fatores precipitantes atuam juntos o tempo todo. 

Criador da página Luta em Luto, que reúne pessoas que perderam um parente vítima de suicídio, Ivo Oliveira Faria expôs a experiência em lidar com a morte da filha mais velha, Ariele, de 18 anos, em março de 2014.

Segundo ele, a busca de novos caminhos é o que deve ser feito para lidar com a perda e ressignificar a vida, quando a pessoa se torna uma sobrevivente.

— Eu homenageio e reverencio a memória da minha filha toda vez que me exponho, que falo disso e contribuo para que a compreensão sobre esses acontecimentos aumente. Sou grato porque, hoje, as pessoas falam abertamente e espontaneamente sobre o suicídio de pessoas próximas. 

Faria não acredita que o luto se esgota e passa em determinado tempo após a morte do ente querido porque ele considera o pesar do suicídio algo insuperável. Por isso, ressaltou, os sobreviventes devem reconhecer a importância da dualidade da vida como elemento natural.

 — A perda de um filho é irreparável e inominável. Quando morre um cônjuge, chamam de viúvo; quando morre pai ou mãe; chamam de órfão; mas, quando morre um filho, não há nome para isso.

A mensagem que eu sempre falo é que a vida não é só a lógica de sucesso e de felicidade que está presente nas redes sociais. A aceitação de que existe o sofrimento é a melhor forma de dialogar com a sina de viver.

O oficial de justiça aposentado contou a experiência adquirida em grupos de apoio — que buscam vivenciar uma atmosfera de auxílio e compreensão, além de compartilhar sentimentos, melhorar habilidades de comunicação e oferecer orientação emocional.

— Esse ambiente de grupo é onde vemos pessoas iguais a nós que estão passando pela mesma tragédia que a gente e lidando com a mesma situação. No geral, a sensação é de pertencimento, você fica acolhido pelos seus semelhantes.

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Maria Helena Pereira. Foto: Amanda Dutra.

Setembro Amarelo o ano todo!

Na conferência Luto e Pósvenção, a criadora do LELu/PUC-SP, Maria Helena Pereira, pós doutora pela Universidade de Londres, definiu o termo como uma forma de prevenção e um conjunto de atividades feito com os sobreviventes do suicídio.

Segundo a estudiosa, a história do movimento de apoio aos sobreviventes começou em 1970, na América do Norte, com a fundação do primeiro grupo de apoio ao luto por suicídio.

— Essa medida visa atenuar efeitos traumáticos desse tipo de morte e cuidar da saúde mental dos que ficaram. A ajuda é oferecida com auxílio em assuntos práticos, como documentação, por exemplo; informações sobre enterro, encontro com quem já viveu aquilo em grupos de apoio.

Maria Helena afirmou que, após um suicídio, é comum as pessoas próximas da vítima busquem respostas ao ato. De acordo com ela, o ato de amparar a própria dor e procurar novas saídas ao sofrimento é importante para que esses indivíduos voltem a interagir com os outros. 

Ela definiu o luto como algo particular, mas reiterou que ele é vivido em um contexto social. Maria Helena criticou a visão reducionista sobre o suicídio — que considera o ato como se fosse igual em todos casos e tivesse impacto semelhante em todos os indivíduos.

O sobrevivente não precisa ser delineado, pois é preciso respeitar a dor de cada um, ressaltou ela. Segundo a criadora do LELu/PUC-SP, o luto envolve oscilações entre viver a perda e restaurar a vida.

Prevenção do Suicídio

No encontro Abordagens Multiprofissionais na Prevenção do Suicídio, o psicólogo Victor P. Silva (UERJ) e o subtenente Daniel Carius, do Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Rio de Janeiro (CBMERJ), discutiram a importância do suporte profissional na prevenção dos casos de suicídio e o diferencial da abordagem do Corpo de Bombeiros no Rio.

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Psicólogo Victor P. Silva (UERJ) e o subtenente Daniel Carius (CBMERJ). Foto: Amanda Dutra.

Segundo Carius, a antiga tática de abordagem às pessoas quem tentavam tirar a própria vida era vista como violenta aos olhos da sociedade, pois solucionava o problema para o bombeiro, mas não para o tentante.

Ele explicou que o novo método protege o bombeiro de transtornos e de um estresse pós-traumático, além de não gerar mais problemas psicológicos para quem tentou suicídio, que se sentia traído pelo bombeiro.

SETEMBRO AMARELO – RECONHEÇA UMA PESSOA COM DEPRESSÃO E ANSIEDADE

Carius comentou que essas pessoas se dividem entre o dilema de ter vontade de dar fim a sua dor e o instinto de sobrevivência, e que o bombeiro responsável precisa dominar técnicas que o faça enxergar o valor da vida. De acordo com o subtenente, em apenas 3% dos pedidos de atendimento os bombeiros não conseguem chegar a tempo.

O bombeiro-negociador deve conhecer os mecanismos de leitura corporal, ter paciência e tempo, e respeitar a questão de um silêncio inicial e a zona interpessoal de aproximação. Segundo Carius, é fundamental saber como se apresentar e estabelecer vínculos de confiança com o tentante.

– Eu me aproximo dizendo ‘estou aqui para te ouvir’, não posso dizer que estou para ajudar, pois não posso ajudar diretamente.

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Subtenente Daniel Carius, do Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Rio de Janeiro (CBMERJ). Foto: Amanda Dutra.

Diferenciar abordagem dirigida dos tentantes, que podem ser agressivos, depressivos ou psicóticos, é fundamental para iniciar o atendimento. O resultado da nova tática, segundo Carius, é positivo, pois possibilita uma saída digna para o tentante e uma maior humanização da tropa.

Victor Silva, que trabalha no Núcleo de Apoio Psicológico da UERJ, frisou a importância do psicólogo agir com o uso de palavras. Ao contar algumas histórias vivenciadas no atendimento de estudantes, o psicólogo lembrou a importância de dialogar sobre o assunto sem julgamentos. Para ele, é preciso entender cada caso em particular e superar o tabu.

– O suicídio chega na clínica como uma indecisão. O psicólogo deve ouvir, ver o que está em questão e tentar acolher o que o paciente trouxer como aflição.

Por Gustavo Magalhães – Fala! PUC Rio

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