O ano é 2012. O mundo acaba de sobreviver à profecia maia de fim do mundo quando surge uma figura que, entre cavalos, mulheres, roupas extravagantes e uma dança, no mínimo, peculiar, acaba de romper a barreira dos 1 bilhão de visualizações no YouTube. É a estreia não só do k-pop, o estilo sul-coreano de fazer música, e do cantor PSY para o mundo, mas também da primeira marola do que viria ser a grande onda coreana – também conhecida como hallyu – no ocidente.
Popularização da cultura coreana
O hallyu causou não só a popularização da cultura coreana, mas também a quebra da hegemonia norte-americana no cenário cultural. Desde o sucesso de Gangnam Style, novas ondas surgiram e, com elas, novos nomes que misturam elementos do pop ocidental e da música tradicional do país asiático.
Em 2019, o grupo BTS, além de dominar 11 das 25 primeiras posições no ranking de mais vendidos, se tornou a primeira banda a colocar três álbuns no topo da lista da Billboard em menos de um ano, o que não acontecia desde os Beatles. Ao mesmo tempo, a sensação feminina Blackpink teve a maior estreia de um vídeo na história da Internet, com mais de 56 milhões de visualizações nas primeiras 24 horas com Kill This Love, superada posteriormente apenas por Boy with luv, outro sucesso do k-pop do BTS em parceria com a cantora estadunidense Halsey.
O sucesso do k-pop é resultado de anos de incentivos públicos e privados para fazer da cultura coreana um produto de exportação. Desde a década de 1990, com a grande crise financeira asiática, o governo da Coreia do Sul investe massivamente para globalizar seus produtos nacionais.
O primeiro sucesso do investimento foi a novela What is love, em 1997, que obteve altíssimos índices de audiência na China. Os k-dramas, nome dado às dramaturgias, conquistaram toda a Ásia e ganharam o mundo, levando também suas trilhas sonoras a fazerem sucesso. O k-pop chegou a ter uma espécie de secretaria própria no Ministério da Cultura do país e, hoje, é liderado por empresas privadas que selecionam os artistas da próxima geração.
As parcerias são uma das principais estratégias da indústria musical coreana para ganhar o ocidente. Dua Lipa, Halsey, Leslie Grace, Jason Derulo, Akon e Will.i.am, da Black Eyed Peas, são apenas um dos nomes que já fizeram participações em músicas e clipes.
O setor aproveitou principalmente a queda da indústria fonográfica tradicional e partiu para a distribuição de conteúdo através de plataformas de vídeos e serviços de streaming, apelando para fortes impressões visuais.
Além das parcerias, a inter-relação com os diferentes polos da cultura local, como músicas, novelas e beleza, é uma artimanha também bastante utilizada para conquistar cada vez mais quem se sente atraído pelos diferentes aspectos da cultura pop oriental.
Para Babi Dewet, o gênero é como um buraco profundo demais onde se pula e não consegue sair. “A gente começa a gostar e, de repente, você se vê amontoado de coisas, grupos e cores diferentes e você não consegue mais sair. Eu conheci o k-pop por volta de 2012, quando abri um canal no YouTube falando sobre isso, na época, com os dramas, as novelas coreanas. Daí fui pesquisar as músicas, as trilhas sonoras, vi quem era que fazia e foi indo.”, comentou a escritora e produtora de shows do gênero em entrevista ao Conversa com Bial, programa da TV Globo.
Os artistas do gênero, chamados de Idols, precisam passar por um rigoroso processo de seleção, que pode durar mais de 9 anos. Por isso, costumam treinar desde os doze em uma rotina que se assemelha a de atletas olímpicos e bailarinas profissionais.
K-pop: Estratégias de mercado
Além de cantar, dançar, atuar, lidar com as redes sociais, apresentar, modelar e se encaixar em um padrão de beleza determinado, os Idols precisam saber ser fofos. Sim, é isso mesmo. Ser fofo é inclusive uma função dada a um dos integrantes dos grupos formados pelas grandes produtoras do setor. Na verdade, cada um dos participantes tem uma função especial, como a de fazer raps, ser a cantora ou a dançarina principal ou, como já falado, ser fofo, função dada geralmente ao integrante mais novo dos grupos, o maknae.
A estratégia é uma das adotadas para promover o aspecto “cute” – fofo, em inglês, “cute-cute”, na gíria brasileira – do costume coreano, presente não só na música, mas em produtos de beleza, acessórios e roupas.
Além de músicas e novelas, os filmes também ganham espaço no cenário mundial. Parasita, do diretor Bong Joon-ho, foi o primeiro filme de língua não-inglesa a ganhar o Oscar de Melhor Filme, além de Melhor Roteiro Original, Melhor Direção e Melhor Filme Estrangeiro. Em seu discurso no palco do Globo de Ouro, onde também ganhou o Prêmio de Melhor Filme Estrangeiro, Joon-ho disse: “Quando vocês conseguirem escalar o muro de 3 cm das legendas, terão acesso a um novo mundo de cinema”, mencionando a rejeição de Hollywood por filmes de línguas que não seja o inglês.
Além do ganhador do Oscar, outros longas-metragens aparecem em listas para se conhecer o cinema sul-coreano, como O Hospedeiro, também de Bong Joon-ho, Um Dia Difícil, de Kim Seong-hun, e High Society, de Byun Hyuk, entre outros.
A Coréia do Sul já colhe os frutos do sucesso de sua cultura no ocidente. Só o BTS é responsável por levar ao país mais de 3,5 bilhões de dólares por ano. Além do dinheiro, o tigre asiático colhe também sua influência ao redor do planeta, e isso se mostra no aumento de viagens ao país, maior interesse em cursos da língua coreana e maior exportação de produtos.
Segundo o Instituto Hyundai, o turismo total do país triplicou nos últimos 15 anos, sendo que 1 a cada 13 turistas citou o BTS como motivo de escolher visitar a Coréia do Sul, o que leva a incluir cenários e locações de clipes nas rotas de guias turísticos locais. Dos anos 2000 até 2018, o número de estadunidenses matriculados em cursos de coreano saltou de 163 para 14 mil, mais de 8.500%, segundo a BBC.
O sucesso da influência do hallyu fez crescer o movimento pop de outros países asiáticos, como o Japão, com seu j-pop, e até a China, que surge e se interessa cada vez mais no cenário musical.
A onda coreana se tornou um verdadeiro tsunami oriental e prevê seu crescimento ainda maior em linhas de cosméticos e produtos que seguem a temática “fofa”, além dos valores orientais de beleza, como a valorização da pele sem Sol e maquiagens unissex. Graças à Internet, o efervescente mercado da cultura mundial parece estar cada vez mais perto do Oriente. Aqui, você pode acompanhar as principais faixas deste sucesso, ou como dizem na Coreia do Sul, ?? ? ??? ?? – maiores hits do k-pop, em português.
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Por Pedro Guimarães – Fala! UFRJ