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BRTs em trânsito lento: Ônibus no Rio de Janeiro enfrentam problemas

Quem usa os ônibus articulados no Rio sofre com redução da frota e falta de manutenção

Portas amassadas, aparelhos de ar condicionado quebrados, redução da frota de veículos, superlotação em horários de pico na pandemia, assédio, calotes, vandalismo, furtos, estações desativadas e a falta de manutenção dos veículos: dez anos depois de sua inauguração, o sistema de ônibus do BRT, no Rio de Janeiro, enfrenta todos esses problemas. Os ônibus articulados transportam diariamente, na cidade do Rio, 200 mil pagantes, segundo a assessoria do sistema BRT. Quem usa os ônibus articulados reclama da infraestrutura precária e da falta de segurança pública dentro dos veículos.

Entenda os problemas em relação aos ônibus BRT do Rio de Janeiro

Até 2020, o sistema foi administrado pelo consórcio operacional BRT. No mesmo ano, a empresa BRT Rio S.A assumiu a gestão. Ambas as empresas forneciam serviço à prefeitura do Rio de Janeiro. Porém, o caos nos articulados chegou a tal ponto que a prefeitura decidiu intervir no sistema com o propósito de atuar em toda a estrutura do BRT Rio. O custo de todo o projeto dos BRTs já passa dos 7,9 bilhões de reais, só com a construção das quatro linhas (Transoeste, Transolímpica, Transcarioca e Transbrasil), segundo a prefeitura do Rio. A linha Transbrasil ainda não foi inaugurada.

Desde 22 de março deste ano, a prefeitura realiza uma intervenção e diz que vai assegurar e recuperar a qualidade dos serviços do BRT. Enquanto isso, os transtornos persistem e milhares de passageiros sofrem com o sucateamento dos articulados. A nossa equipe entrou em contato com as duas empresas que atuaram na gestão do BRT Rio antes da intervenção da prefeitura, mas não houve retorno das ligações e dos emails enviados.

Antes da pandemia, a frota diária dos articulados era cerca de 413 veículos; hoje são 200 ônibus circulando pelas três linhas (Transoeste, Transolímpica e Transcarioca). Bethânia Barbosa, de 48 anos, moradora de Campo Grande, que utilizava o BRT todos os dias para trabalhar, na Barra da Tijuca, disse que, no decorrer dos anos, o BRT foi ficando muito sucateado e que a superlotação dos ônibus em tempos de pandemia a deixou muito preocupada em relação ao contágio do vírus. “É uma condição desumana andar no BRT. Os ar condicionados não funcionam. Eu retiro uma porcentagem do meu bolso para complementar em um outro transporte público menos ruim, o trem”, contou.

A assessoria do BRT disse que assumiu a gestão da empresa em março deste ano (2021), em meio a um quadro de degradação do serviço. “A frota de articulados encontrava-se em estado extremamente precário, uma das primeiras medidas adotadas pela Equipe de Intervenção foi intensificar a manutenção corretiva, para aumentar gradativamente os BRTs em operação”.

A superlotação dos ônibus em tempos de pandemia ainda permanece. Victor Bui, de 19 anos, estudante de engenharia, também contou que precisa usar os articulados para ir até a universidade e se depara com filas gigantescas, menor circulação de BRTs e os ônibus passando em intervalos de 20 em 20 minutos em dias de semana.

Os ônibus BRT, no Rio de Janeiro, estão em más condições.
Os ônibus BRT, no Rio de Janeiro, estão em más condições. | Foto: Reprodução.
Os BRTs estão superlotados.
Os BRTs, ônibus do Rio de Janeiro, estão superlotados. | Foto: Reprodução.
O Grito do Subúrbio.
O Grito do Subúrbio. | Foto: Breno Carvalho.

Das 125 estações espalhadas pelas três linhas (transoeste, transolímpica e transcarioca) e 9 terminais, apenas 69 estavam em funcionamento em 2020, ou seja, morar praticamente em frente a uma estação de BRT não garante mais facilidade de deslocamento até o trabalho. Laura Pedroso, de 27 anos, moradora da Penha, que utilizava a estação do Guaporé para ir até o Recreio, o seu local de trabalho, precisa andar até a estação praça do Carmo diariamente para conseguir pegar o BRT. Para isso, Laura sai com antecedência de casa e, na volta, precisa ir à noite sozinha para casa todos os dias, o que é um perigo devido aos casos crescentes de violência na cidade do Rio de Janeiro. A estação da linha transcarioca, Guaporé, está desativada há mais de um ano.

Segundo a assessoria do BRT Rio, quando tomaram posse da gestão dos veículos articulados, 46 estações estavam fechadas e que após serem reformadas, 11 já foram entregues aos cariocas e que todas as outras, serão reabertas até outubro. Questionado sobre o porquê de várias estações estarem desativadas, a prefeitura e o BRT Rio disseram que essa situação se dá pelo vandalismo e pelos furtos de equipamentos, e que o prejuízo chega a ser de 100 mil reais mensalmente totalizando no final do ano com um rombo de 1,2 milhões aos cofres públicos.

A equipe do BRT disse ainda que todos os pontos considerados frágeis no modelo anterior foram mudados. Painéis de vidro das estações foram substituídos por chapas de ferro vazadas, a fiação foi embutida e mecanismos das portas blindados; alarmes luminosos e sonoros das portas e trava automática das portas. A entrada só será possível apenas pelas catracas próximas às bilheterias instaladas nos dois lados da estação, que foram reformadas. Entre os serviços executados estão ainda pinturas interna e externa, novas instalações elétricas e programação visual, reforço na iluminação e colocação de guarda-corpos.

Sobre o vandalismo e a falta de segurança nas estações, a Secretaria Municipal de Ordem Pública disse que o patrulhamento é realizado de forma fixa nas estações e também por meio de rondas diurnas e noturnas para prevenir depredações nos três corredores (Transcarioca, Transoeste e Transolímpica).

Muitas estações, porém, seguem sem patrulhamento de segurança. Ludimilla Marques, 32 anos, moradora de Madureira nos contou que a segurança pública no BRT é quase inexistente, e que a segurança é mais concentrada em estações mais específicas como, por exemplo, nos terminais.

Os terminais e estações de ônibus no Rio de Janeiro também estão em péssimas condições.
Os terminais e estações de ônibus no Rio de Janeiro também estão em péssimas condições. | Foto: Reprodução.

Portas amassadas e quebradas; ônibus queimados; vidros trincados, bancos soltos e ar condicionados que não dão vazão. Os passageiros reclamam desses problemas que precisam ser enfrentados todos os dias nos BRTs, que prejudicam o conforto e a segurança ao longo de todo o trajeto. Raphaella Fernandes, de 22 anos, estudante de Marketing e que utiliza o BRT há aproximadamente três anos para ir ao trabalho todos os dias, disse que o BRT se encontra extremamente precário e que os principais problemas na opinião dela são: superlotação, ar condicionados quebrados, portas amassadas, janelas quebradas, sem circulação de ar e que com a pandemia da Covid-19, os articulados ficaram ainda piores. 

Além desses conflitos, Raphaella ainda contou que antes da pandemia havia um BRT expresso na linha transolímpica que ligava Sulacap ao Jardim Oceânico, e era muito eficaz pela rapidez. Porém, com a pandemia e o distanciamento social, os ônibus que faziam esse trajeto diminuíram e consequentemente os outros articulados ficaram ainda mais lotados.

Nossa equipe questionou a Rio ônibus sobre os problemas relatados por Raphaella e pelos outros passageiros, a qual é responsável por focar na melhoria e na eficiência e produtividade das empresas de ônibus para promover o conforto e a qualidade do serviço prestado ao passageiro. A Rio ônibus falou que o BRT está sob intervenção da prefeitura. Então, questionamos a secretaria municipal de transporte público (SMRT) que nos disse: “A Prefeitura do Rio prepara uma nova licitação para provisão de frota e operação do sistema BRT, prevista para ser lançada em dezembro deste ano. A proposta é que sejam comprados novos articulados, adquiridos em lotes a partir do segundo semestre de 2022.”

Até lá, a solução é esperar e torcer para que a promessa saia do papel. Em relação aos articulados em situação precária, a SMRT disse que muitos desses problemas são gerados pelo vandalismo.

Além de todos os problemas existentes no BRT, o alto índice de assédio nos articulados e nas estações é alarmante. Muitas mulheres se sentem inseguras, acuadas e amedrontadas pelas situações de desconforto que precisam passar durante o trajeto. 

Carolina, de 26 anos, estudante do curso de letras na UFRJ, que utiliza a linha do BRT Rio Transoeste todos os dias para trabalhar, nos contou que já sofreu assédio dentro BRT, e tenta usar roupas que cobrem totalmente as partes do corpo para evitar que homens fiquem olhando; mas, ela disse que isso nem sempre é um método eficaz de se prevenir do assédio, pois devido aos ônibus virem lotados, os homens costumam “sarrar” nas mulheres quando elas estão em pé nos articulados. Carolina já foi assediada três vezes, e conclui relatando que já presenciou vários episódios desse tipo e que muitas vezes não há o que fazer para se defender dos assediadores, porque não há seguranças.

A nossa equipe questionou a prefeitura do rio sobre os assédios e a resposta foi que: “a prefeitura lançou um Programa Permanente de Prevenção e Enfrentamento ao Assédio no Transporte Público. As vítimas poderão reclamar sobre situações de assédio pelos canais da Central de Atendimento ao Cidadão, no telefone 1746, ou por mensagem no aplicativo WhatsApp (21) 3460- 1746”.

Uma boa alternativa que poderia ter sido colocada em vigor seriam os vagões femininos no BRT, mas o TJ-RJ anulou a lei que reserva espaços para mulheres e crianças no BRT. Para o TJ, a reserva de espaço nos ônibus do BRT só pode ser proposta pelo prefeito e não pela Câmara Municipal. Mesmo durante o curto espaço de tempo que o vagão feminino no BRT existiu, ainda ocorriam denúncias de assédio.

Campanha contra assédio.
Campanha contra assédio. | Foto: Reprodução.

Os altos índices dos calotes nos BRTs são frequentes desde a sua inauguração. Segundo um levantamento feio pelo BRT Rio, em 2021, cerca de 20% dos usuários dão calote – algo em torno de 34 mil pessoas. Milhares de pessoas ao invés de passar pela roleta acabam por pularem os portões de embarque para não pagar o valor da passagem. Isso se dá pela falta de fiscalização e de policiamento da guarda municipal e pela falta de punição contra esses infratores. João Pedro Paiva, de 24 anos, morador do tanque, disse que presencia diariamente os calotes nas estações de BRT e que isso se dá pela falta de segurança. João ainda disse que essa prática se torna injusta com todos os outros passageiros que pagam corretamente todos os dias e que espera por melhorias nesse sistema.

Em relação à segurança, em junho foi implementado o programa BRT Seguro, coordenado pela Secretaria Municipal de Ordem Pública (SEOP). A SEOP respondeu dizendo que: “Estações e terminais tiveram reforço no patrulhamento, feito por agentes da Guarda Municipal e da Polícia Militar, para maior segurança dos passageiros, combate ao calote, atos de vandalismo, além da promoção do ordenamento. Também são feitas rondas noturnas no sistema. Quem dá calote no BRT ou em qualquer meio de transporte público corre o risco de ser preso por crime previsto no Código Penal, Art. 176.” Nesse sentido, o patrulhamento não tem sido eficaz, pois ainda é constante a prática dos calotes nas estações do BRT Rio. A multa pode chegar até 170 reais para os “caloteiros”. A SEOP não divulgou o valor do prejuízo referente aos calotes.

A empresa de ônibus do Rio de Janeiro, BRT, vem sofrendo com calotes da população.
A empresa de ônibus do Rio de Janeiro, BRT, vem sofrendo com calotes da população. | Foto: Reprodução.

Questionada pela nossa equipe por meio da lei de acesso à informação sobre as autuações dos caloteiros, a Secretaria Municipal de Transporte Público (SMRT) disse: “emitimos 6.117 autuações contra o Acordo Operacional BRT nos anos de 2020 e 2021 devido às irregularidades”.

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Por Vinicius Macêdo – Fala! UFRJ

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