Especialista do tema coloca a juventude na linha de frente desta missão.
O grande dilema daqueles que ainda estão apegados aos direitos fundamentais de uma civilização humanizada é sobre como trazer gente para o lado da defesa dos direitos humanos. Como furar essa bolha que a modernidade virtual constrói? Esse papel de sensibilizar pessoas e as colocar em um posicionamento pró-direitos humanos está demarcado desde o primeiro momento em que esses direitos foram percebidos.
É isso que o advogado Jefferson Nascimento, especialista do tema há 16 anos, explicou em apresentação na sede da ONG Conectas Direitos Humanos, em São Paulo. Com base nos estudos da historiadora Lynn Hunt – da Universidade da Califórnia – frente a um slide que colocava o ano de 1761 em letras garrafais, ele mostrou aquilo que teria sido “a semente dos Direitos Humanos”.
A “semente” no caso era o best seller do século 18 Júlia ou A Nova Heloísa do filósofo suíço Jean-Jacques Rousseau. O livro é um romance epistolar, ou seja, se desenvolve principalmente através de cartas. A história que abordava o amor proibido entre um tutor e sua aluna ficou marcada por desenvolver um sentimento de empatia até então desconhecido aos leitores da época – majoritariamente formadores da classe aristocrata. A empatia que ia além das fronteiras de classe social, sexo e nacionalidade.
Em seu livro A invenção dos Direitos Humanos, Lynn Hunt argumenta que esta “capacidade de identificação através de linhas sociais” pode ter surgido de outras formas para além da leitura de romances. “Ainda assim, ler romances parece especialmente pertinente, em parte porque o auge de determinado tipo de romance – o epistolar – coincide cronologicamente com o nascimento dos direitos humanos”.
Guardadas as devidas proporções, pode-se dizer que Rousseau conseguiu “furar a bolha” da época e confrontar os leitores com ideias que não encarariam naturalmente. Porém, fazendo o “sutil” salto temporal para os dias de hoje, como despertar essa empatia e alinhar pessoas com os direitos humanos?
Não temos uma casta de leitores tão exclusiva como tinha Rousseau. Qualquer celular com conexão capenga permite o consumo de notícias e ideias através da tela. Porém, cada vez mais presos em ambientes virtuais de ideias iguais, qual o caminho para furar a nossa bolha?
Em julho de 2017, a ONG carioca Redes da Maré conseguiu na Justiça uma decisão favorável que colocou em vigor uma Ação Civil Pública (ACP). Esta ação prevê uma série de medidas para diminuir os riscos e os danos durante as recorrentes operações policiais que acontecem na região.
No entanto, desde que o governo de Wilson Witzel foi empossado, em janeiro de 2019, a ação sofre ameaças e chegou a ser suspensa por um mês. Jefferson relembrou uma das ações que a Redes da Maré se empenhou quando houve a suspensão da ACP – a coleta de mais de 1500 cartas escritas por crianças e adolescentes. “A ideia era que as crianças e adolescentes contassem o impacto das operações policiais no cotidiano delas”.
As operações policiais estampam os noticiários diariamente. Quando os impactos destas operações e violações de direitos são colocados em oposição e com repercussão midiática, é potente”, analisa. Através deste exemplo, Jefferson explicita um ativismo de pessoas que não estão em organizações, mas se reconhecem como “sujeitos de direitos”. “Acredito que os jovens estão à frente no exercício de se pensar novas formas de furar a bolha.
Conclui.
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Por Leonardo Lopes – Jornalismo ECA USP