Dizer que cabelo crespo é cabelo duro e ruim se tornou ultrapassado. Parece que falar sobre este assunto nos tempos atuais é perda de tempo ou até mesmo irrelevante, visto que as pessoas costumam classificar os erros dos séculos anteriores como “mimimi”, mas será mesmo que é “mimimi” discutir sobre raça, imagem, representação, identidade e racismo?
O racismo por trás da expressão “Cabelo duro”
É de extrema importância reconhecer os erros do passado para que possamos progredir e transcender como seres humanos no futuro, e isso inclui falar sobre o “cabelo duro”.
Viver em uma sociedade onde só os cabelos lisos são vistos como bons e representativos frustra uma parcela da sociedade que não se inclui nesses estereótipos.
Eu, por exemplo, que vos escrevo este artigo me incluo nessa marginalização cercada de preconceito onde os indivíduos brancos não são capazes de reconhecer a importância da diferença e da pluralidade de texturas. Mas tudo isso tem uma razão: o racismo.
Desde 1.500, para as pessoas pretas que sempre estiveram à margem da sociedade, o inferno é presente neste país de dimensões continentais. Com a chegada dos portugueses nesta terra chamada Ilha de Vera Cruz, aconteceu o processo de escravização de pessoas pretas vindas do continente africano, que culminou em mais de 300 anos de pura tortura, negligenciamento da cultura africana e condições desumanas que me embrulham o estômogo em cogitar escrever neste artigo.
Imagina: ser retirado brutalmente de um país para outro de forma desumana, contra sua vontade, e ser chacota de pessoas brancas que não sabem reconhecer e enxergar a identidade do outro. Não existe cabelo duro. Cada pessoa tem uma textura e curvatura de cabelo diferentes. Um fato que não há margens para questionamentos.
Isso é enriquecedor e ao mesmo tempo fundamental. Que caos seria se fôssemos todos iguais. As diferenças são importantes para a humanidade e isso é o que me faz repudiar completamente o estereótipo de que o cabelo afro e crespo é “duro”.
Cabelo crespo não é duro
Milhões de pessoas pretas com cabelo crespo ou afro já passaram por situações que um bando de gente sem noção passavam as mãos nos seus respectivos cabelos e diziam: “nossa, o seu cabelo é macio”, como se obrigatoriamente o cabelo não pudesse ter maciez por ser crespo ou afro. O racismo mata e esses comentários também. E tudo isso ainda acontece em um século onde as pessoas brancas classificam toda uma luta histórica e cercada de sangue escorrido em cada centímetro deste país como vitimismo.
Penso que uma das maiores culpadas por este comportamento estereotipado criado a partir de uma era escravocrata depois dos portugueses é a mídia. A mídia pauta e dita de uma certa forma tudo que somos, construímos e queremos. Os repórteres, as atrizes e os apresentadores majoritariamente têm cabelos “bons” e isso reflete na sociedade como se somente aquele tipo de cabelo fosse bom, bonito e aceito. Isso é tão velho e ultrapassado como os fósseis de dinossauros.
Precisamos evoluir e representar todos em todos os sentidos, dos cabelos aos pés. A humanidade precisa ser plural e não marginalizada e lutar por isso é um ato político. A mídia precisa dar espaço para que outras pessoas possam se sentir representadas.
Espero que os cabelos blacks e afros possam estar nos comerciais, nas novelas, nas bancadas dos telejornais e até nas propagandas de cabelo. A partir disso, poderemos pensar em um futuro melhor onde todos possam se sentir representados e aceitos em um ambiente que só exclui, mata e marginaliza populações pela cor e pela textura do cabelo.
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Por Vinicius Macêdo – Fala! UFRJ