Assim como na música Dragões, de Karina Buhr, Alice Júnior foi enfrentar leões em Araucárias do Sul, cidade bucólica que, à primeira vista, era o hábitat natural dos conversadores.
O longa-metragem do cineasta Gil Baroni estreou em 28 de setembro de 2019 e foi selecionado para o 70° Festival de Berlim. Neste ano, chegou à Netflix e agora está entre os pré-candidatos a representar o Brasil na edição de 2021 do Oscar.
Alice Júnior – crítica do filme
O enredo do filme todos conhecemos. É no estilo clássico coming of age. Uma garota se muda para uma cidade nova. Sem amigos e sentindo-se sozinha, ela passa por poucas e boas até se encontrar. Então, mesmo com uma narrativa tão banal, o que torna Alice Júnior especial? A resposta é simples: sua protagonista.
A comédia romântica ainda é um ramo cinematográfico extremamente heterossexual e cisnormativo. Portanto, ao colocar uma protagonista trans, a existência de um filme como Alice Júnior passa a ser, em essência, uma revolução que acompanha os nossos tempos.
Não é um filme alienado, irreal e romantizado, mas, sim, colorido. Filmes como Alice Júnior contam outras narrativas trans e abrem novos horizontes para um grupo social tão marginalizado. Sim, Alice é uma adolescente trans que se relaciona com um contexto violento e segregacionista. Porém, Alice também é apenas uma jovem, cheia de potencialidades. O longa-metragem consegue mostrar ao telespectador as opressões que pessoas trans enfrentam, e também as alegrias.
As escolhas do roteiro vão na contracultura de outros filmes que também retratam pessoas trans que, em geral, tendem a resumir as vidas trans ao sofrimento, às angústias e à extrema violência. Alice Júnior não é esse tipo de filme. É uma trama sobre a adolescência e laços afetivos. Assim, fala sobre se transformar.
É um filme destinado ao público juvenil com todos os clichês que temos direito: o triângulo amoroso, a eterna busca pela popularidade e os anseios que acompanham o primeiro beijo.
Se antes o cinema aproximava-se da televisão para buscar ser popular, hoje, ele apoia-se na Internet, seu novo grande amigo. Assim, Alice Júnior apropria-se da linguagem dos memes e outras características fortes na era virtual. Outro ponto positivo no alicerce narrativo.
Com muito bom humor, contesta padrões. Recheado com visibilidade e representatividade trans, com muito protagonismo e feminismo. Adentrar essa jornada com Alice, e também com Jean, Viviane, Taísa, Bruno, Lino e Marisa é sorrir, chorar e aprender.
Uma citação do filme resume bem o papel que a obra presta na contemporaneidade: “Alice, você existe para brilhar’’. E para inspirar e ensinar.
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Por Vitória Prates – Fala! Cásper