O que você pensa quando escuta a palavra guerra? Muito provavelmente, corre na sua imaginação uma série de imagens devastadoras como bombas, mortes e outras representações sangrentas. Contudo, atualmente, vivenciamos um conflito entre duas grandes potências globais e esse confronto não se dá por meio de forças militares, mas sim, no campo econômico e diplomático. Aos moldes da Guerra Fria, o governo americano e governo chinês vêm intensificando atritos e buscando aumentar sua área de influência hegemônica ao redor do globo.
A China, desde o governo do presidente Deng Xiaoping (1978-1992), responsável por abrir a economia chinesa ao mercado internacional, vem crescendo avassaladoramente. Em poucas décadas, o país asiático saiu de uma situação de miséria para ocupar o posto de segunda maior economia global, situação que ameaça constantemente a supremacia americana nas relações internacionais.
Se em um primeiro momento os Estados Unidos mostraram-se solícitos à entrada do gigante asiático na economia global, tendo um papel decisivo na entrada do país na Organização Mundial do Comércio (OMC), em 2001, hoje, no entanto, as relações parecem ter ficado um tanto azedas, principalmente após a eleição de Donald Trump para a Casa Branca.
Nós não podemos permitir que a China abuse do nosso país, e sim, é isso que eles estão fazendo.
Donald J. Trump
O atual presidente americano eleito através de uma retórica extremamente nacionalista e autocentrada (America First), desde a campanha em 2016, solta frases de ataque a China, a exemplo da citada acima. Desde então, muitos estudiosos já previam um acirramento nas relações diplomáticas e econômicas entre Washington e Beijing, previsão essa que logo tornou-se realidade.
Explorando o argumento de que a China estaria roubando empregos dos trabalhadores da indústria americana, uma das maiores bases de apoio de Trump, o governo americano vem fechando o cerco para os produtos chineses. Um grande exemplo foi a taxação das importações no aço e no alumínio chinês, logo respondida por uma retaliação nas importações de soja e outros produtos agrícolas oriundos dos EUA por Xi Jinping.
Washington também acusou empresas de tecnologia chinesas de roubarem informações de seus usuários e de empresas ocidentais, focando suas críticas na Huawei, principal concorrente de empresas como Apple e Samsung no mercado mobile, além de ser uma das empresas na linha de frente da produção do 5G. De acordo com a Casa Branca, as denúncias se baseiam na Lei de Inteligência Nacional da China aprovada em 2017, que em seu artigo 7 fala:
Qualquer organização ou cidadão deve apoiar, auxiliar e cooperar com o trabalho de inteligência do Estado, de acordo com a lei, e manter os segredos do trabalho de inteligência nacional conhecidos do público.
Lei de Inteligência Nacional da China, art.7
Por conta disso, a gestão Trump barrou empresas norte-americanas de negociarem com a Huawei, fazendo com que a Google, desenvolvedora do sistema operacional usado nos aparelhos da empresa chinesa, parasse de enviar atualizações para os usuários desses smartphones. Além da prisão, a mando dos EUA, da diretora financeira da gigante chinesa na cidade canadense de Vancouver, ainda em 2018.
A crise diplomática entre os dois países agravou-se recentemente com a pandemia de Covid-19. Washington acusa Beijing duramente de ineficiência em controlar a disseminação do vírus e, inclusive, de se aproveitar da calamidade global para se fortalecer economicamente.
Enquanto os EUA vêm tomando uma postura de enfrentamento mais autocentrada, ao invés de um plano mais coordenado com os interesses globais, o que se esperaria de um país que desde o fim da Segunda Guerra, sempre encabeçou os esforços para superação das crises mundiais, a China vem adotando uma política que é chamada por alguns especialistas como “diplomacia das máscaras”.
Delegações com médicos chineses e suprimentos de máscaras e outros materiais de proteção foram enviados por Beijing a países que enfrentam o novo coronavírus. Do outro lado, o governo americano vem sendo acusado de dificultar a compra de materiais e até mesmo roubar contratos que iriam para outros países, inclusive governos aliados de longa data.
O Brasil em meio ao confronto entre China e EUA
Porém, você deve estar pensando: o que é que isso tudo tem a ver com o Brasil? A resposta é tudo. Tanto a China quanto os EUA são importantes parceiros comerciais nossos e num curto prazo podemos lucrar bastante. Com a sobretaxa na soja americana, a China pode querer buscar outros mercados mais atrativos, o Brasil, sendo o terceiro maior exportador agrícola do mundo, pode ser o substituto perfeito dos americanos. Nosso país também pode se aproveitar do vácuo deixado pelo alumínio e aço chinês no mercado americano, destinando nossas exportações para os EUA.
No entanto, o inverso também pode ocorrer – ambos os países podem tentar empurrar seus excedentes barrados em certos mercados e direcioná-los ao Brasil. Por exemplo, os manufaturados chineses, que perderam espaço nos EUA, caso venham parar no Brasil, causariam uma competição desleal com a indústria nacional. Prejudicando ainda mais a lenta recuperação econômica brasileira.
Especialistas ressaltam também que, a longo prazo, a situação acaba por se tornar insustentável para todos, já que tantas e seguidas taxações acarretariam em uma diminuição no consumo a nível global, consequentemente, reduzindo a taxa de crescimento da economia mundial. Ou seja, a continuação e agravamento das hostilidades econômicas entre as nações pode nos jogar para uma recessão econômica, da qual o Brasil também seria atingido.
Todavia, os impactos não seriam percebidos apenas pelos mercados financeiros, ainda segundo especialistas, a taxação de itens básicos de consumo (soja, arroz e outros produtos agrícolas) pode aumentar o custo de vida da população de baixa renda, sem, em contrapartida, ocorrer um aumento no poder de compra. Infelizmente, cabe a nós apenas acompanhar o desenrolar dessa novela e suas consequências na vida de todos.
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Por Jefferson Ricardo – Fala! UFPE