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Opinião – Governo Bolsonaro: a história realmente se repete?

As semelhanças do contexto político brasileiro a partir da ascensão de Jair Bolsonaro com o ocorrido em outras épocas durante governos altamente autoritários

A polarização política no Brasil fica cada dia mais evidente. Saímos de 14 anos de um governo que prezava por ideias mais populistas e caminhamos para o caminho totalmente oposto. Promessas e atitudes que ferem os direitos humanos foram altamente promovidas e apoiadas pelo governo atual, fato que faz com que uma parcela da população tenha medo da volta de cenários que já ocorreram em tempos sombrios passados.

Nos anos 30, a Alemanha passava pela pior recessão da sua história. Acabara de perder a Primeira Guerra Mundial e sofria com as consequências do Tratado de Versalhes. Somando-se, assim, as perdas econômicas do pós-guerra, o crescimento da ideologia socialista, a falta de perspectiva da população e o revanchismo contra a França devido ao conflito, nascia no país um discurso extremamente nacionalista. Com ele, o antissemitismo e a ideia de que a única forma de acabar com a trágica situação que a pátria se encontrava era por meio de um governo forte. Autoritário. Com ele, veio Hitler. O resto da história, já sabemos.

Em 2008, o mundo enfrentou uma das maiores crises econômicas já vistas. O Brasil demorou para ser atingido, mas, em 2013, começaram os primeiros sintomas do mal que viria. Em um governo que priorizava as políticas populistas, o descontentamento da elite fazia-se cada vez mais presente. Ao mesmo tempo, explodiu uma das maiores investigações em cima das corrupções no governo brasileiro da história do país.

Assim, a recessão econômica, a crise moral dentro do governo e a falta de fé da população em seus governantes impulsionou a criação de um discurso altamente nacionalista. Com ele, a ex-presidente Dilma sofreu um processo de impeachment por motivos anticonstitucionais e a ideia de que apenas um governo forte pudesse colocar o Brasil de volta nos trilhos tornou-se cada vez mais forte. Com ele, surgiu a figura de Jair Bolsonaro.

bolsonaro fascista
Bolsonaro apresenta atitudes semelhantes a ditadores. | Foto: Reprodução.

Percebeu a semelhança?

Todo governo autoritário tem suas particularidades, mas possuem um contexto histórico altamente similar. Primeiramente, a crise econômica e política são uma das principais causas para a adoção de discursos extremistas como uma forma de sair da situação trágica em que o país se encontra.

Além disso, a falta de perspectiva de melhora por parte dos cidadãos faz com que qualquer discurso que prometa uma melhora seja altamente aclamado e requisitado. E, por último, o crescimento do ódio é o elemento final para a consolidação de um ambiente favorável ao autoritarismo.

Segundo o historiador Luiz Felipe Galvão – graduado, mestre e doutor pela UFRJ -, essa tendência se inicia no país a partir de 2013:

Acredito que todo esse fenômeno começou em 2013, nas manifestações. Foi de lá que saíram os grupos que articularam toda a população a comprar esse discurso de necessidade de trazer de volta a moral que falta no governo brasileiro através de uma figura forte e conservadora. MBL, Movimento Vai Pra Rua, todos eles tiveram uma participação nesse fenômeno que culminou no que estamos vivendo hoje.

Não foram poucas as vezes que escutamos discursos vindos do atual presidente da República desprezando a democracia, igualdade, cultura e qualquer ponto de vista que difere do seu próprio. O flerte entre Bolsonaro e a figura ditatorial ocorre desde antes da eleição, e ele nunca fez questão de esconder a admiração pelos ditadores que dominaram o nosso país após o golpe de 1964. Mas o problema não se limita a ele.

Dentro do seu governo, foram nomeados inúmeros outros que pensam e agem da mesma forma. Roberto Alvim, ex-secretário da cultura, nomeado pelo próprio Jair Bolsonaro, foi exonerado por ter plagiado o discurso de Joseph Goebbels, antigo ministro nazista. Além dele, o principal ministro do governo atual, Paulo Guedes, afirmou em uma entrevista que “Não se assustem se alguém pedir o AI-5”, ao falar sobre os diversos protestos que estavam ocorrendo pela América Latina.

Além disso, muitas outras ações do presidente refletem aquelas adotadas pelo governo nazista, na década de 30. Uma das propostas do político, e que foi colocada em prática nos primeiros meses de mandato, foi a subjugação da educação e da cultura, a partir da extinção do Ministério da Cultura e o corte de mais de 5 bilhões em verbas para as universidades públicas e pesquisas. O desprezo e falta de investimento nessas duas áreas já é uma velha e conhecida prática de governos mais autoritários, assim como a censura, como uma forma de alienação e controle das grandes massas, também adotado pelo regime de Adolf Hitler.

Ademais, os constantes ataques à imprensa feitos pelo presidente demonstram sua aversão à liberdade de imprensa e direitos previstos na Constituição de 1988, como o direito à informação. Desrespeitar a imprensa não é apenas desrespeitar o jornalista, mas sim toda a sociedade civil que sofre com a desinformação, ainda mais em tempos de fake news. “Que imprensa canalha, a Folha de S.Paulo. Canalha é elogio para a Folha de S.Paulo” e “Cala a boca, não perguntei nada” foram apenas algumas das diversas ofensas já feitas por Bolsonaro aos veículos de comunicação nacionais.

O governo Bolsonaro possui uma ideia de que, se você é contra ele e sua ideologia, é contra todo o país. Esse mesmo tipo de discurso foi adotado por Hitler na Alemanha, como forma de extinguir qualquer tipo de oposição.

Porém, o Bolsonaro não se elegeu sozinho. Ele encontrou sua maior força no conservadorismo intrínseco da população brasileira e no moralismo católico que acompanha o país desde a sua colonização. O presidente adotou uma política de aproximação com as igrejas evangélicas muito semelhante à adotada por Mussolini e Hitler com a Igreja Católica, antes da Segunda Guerra.

Além disso, o presidente conseguiu atingir um público muito específico, no qual a grande maioria possui até 44 anos, 62% ganham de 2 a 10 salários mínimos por mês, e 48% habitam a região sudeste, considerada como a mais rica do país.

Bolsonaro conseguiu atingir muito bem a elite que estava insatisfeita com o governo passado. Eles tinham outras opções de candidatos para eleger, mas o antipetismo fez com que unissem os votos contra um inimigo em comum.

Esse eleitorado jovem nos mostra, também, que a grande parte das pessoas que elegeram um homem que preza e reproduz os discursos da época da ditadura, nem vivos estavam para presenciar os horrores cometidos na época.

O Brasil tem a tendência de esquecer seu passado, tem memória curta. Saímos de 20 anos de um governo ditatorial, que cometeu inúmeras maldades e nos afundaram na pior crise econômica da história do Brasil, e há pessoas que acreditam que essa é a nossa melhor saída.

Hoje, com 17 meses de Jair Bolsonaro no poder, a incerteza reina. Uma pandemia mortal instaurada e o Brasil como um dos novos possíveis epicentros da doença , a falta de habilidade política do presidente para agir corretamente e proteger o país  é colocada em xeque. A sua forte base política enfraquece cada vez mais e o sonho de construir um governo forte, militarizado e centrado em sua figura parece ser cada vez mais distante.

Pra mim, o que mais assemelha o Bolsonaro ao Hitler e Mussolini é o completo desprezo pelos outros poderes, pelos direitos humanos e, principalmente, pela vida humana no geral.

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Por Anna Casiraghi – Fala! Cásper

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