Atrás somente de Filipinas e Colômbia, mortes de ativistas em território nacional atingem 24 pessoas por ano
Por triste ironia, o País com uma das biodiversidades mais ricas do planeta é também o que mais mata seus defensores. Em relatório anual da ONG Global Witness, divulgado em julho de 2020, dados apontam que, em 2019, 24 ativistas ambientais e de direitos humanos (dentre eles, 10 indígenas) foram assassinados. Atrás somente de Filipinas, com 43 mortes, e Colômbia, com 64, o Brasil apresenta um aumento de 4 vidas perdidas em relação ao ano anterior.
Das 212 pessoas que foram mortas ao redor do mundo, dois terços residiam na América Latina. Apesar de apresentar recorde de números, a região ocupa o posto de maior índice de mortalidade desde 2012, ano em que a ONG iniciou o levantamento e divulgação dos dados. O Brasil, que segue no top 5 de países que menos respeitam e zelam pela vida daqueles que protegem os ecossistemas e a biodiversidade, ocupou a liderança do ranking até 2017, quando o número de assassinatos chegou a 57.
Morte de ativistas ambientais no Brasil e no mundo
Vale também destacar que 90% dos homicídios de ativistas ambientais ocorreram na Amazônia, região que abriga a maior parte das florestas e populações indígenas brasileiras. Dentre os inúmeros fatores que vêm desencadeando um agravamento na situação brasileira, estão as políticas antiambientalistas, idealizadas e aprovadas pelo governo de Jair Bolsonaro (sem partido).
As agressivas medidas, que arquivam pastas de direitos fundamentais ao meio ambiente, visam estimular a mineração em escala industrial e abrem as porteiras para o agronegócio e o garimpo ilegal. Essas concessões contextualizam os dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e da Conectas Direitos Humanos, que apontam que o desmatamento ilegal de terras indígenas aumentou 74% entre 2018 e 2019.
A Global Witness também destaca Bolsonaro como uma das lideranças internacionais que mais criminalizam as manifestações pacíficas dos defensores da terra e do meio ambiente. E não à toa – o presidente vem, desde o início de seu mandato, ignorando a importância de conservar nossas riquezas naturais, que são fundamentais para a integridade da sociedade, o clima e a economia global.
Além disso, menospreza a proteção e os direitos indígenas dos povos, que encontram-se ainda mais vulneráveis com a pandemia. Juntando todos esses fatores, entende-se por que o Brasil propaga tamanho descaso com os defensores de sua terra.
Pandemia como agravante
Com a pandemia da Covid-19, nós, enquanto sociedade civil, tivemos que reaprender a viver e nos adaptar ao isolamento social, que, apesar de ser um grande desafio, é comprovadamente a melhor opção para prevenir a proliferação em massa do novo coronavírus, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), sejamos da cidade, do campo ou das florestas.
Entretanto, na contramão de todas as recomendações dos órgãos públicos de segurança sanitária, grileiros, madeireiros e garimpeiros não paralisaram suas atividades e seguem a todo vapor cometendo atividades criminosas que destroem a floresta. Sem respeitar o isolamento e qualquer lei de proteção de terras indígenas, os garimpeiros e madeireiros tornam-se transmissores do coronavírus para os mais de 400 mil indígenas dos 180 povos, que há milênios vivem na Amazônia e apresentam historicamente uma vulnerabilidade epidemiológica.
Esse fator agravante faz com os ativistas ambientais, além de não darem conta de supervisionar e lutar pelas terras e povos, fiquem ainda mais vulneráveis de descredibilizados pela população, uma vez que as preocupações e focos midiáticos estão todos voltados para a doença que assombra, sobretudo, as grandes cidades do País.
Ao redor do mundo
Os dados assombrosos que recaem sobre o Brasil também percorrem outras partes do mundo e mostram que, independente da nacionalidade, vivemos tempos em que a militância ambiental e pela vida é vencida pela ganância do lucro a qualquer custo.
Colômbia (64) e Filipinas (43, ou seja, 30 a mais do que em 2018) somam, juntos, metade das mortes documentadas em todo o globo. Na Colômbia, os assassinatos de líderes comunitários ultrapassaram o dobro no último ano. Um dos impulsionadores da violência que só cresce no país foi a dinâmica do poder local resultante do acordo de paz de 2016 entre o governo e as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia).
Além disso, o país assiste a um notório crescimento de grupos paramilitares e criminosos que investem no comércio de drogas. A GW registrou 14 mortes vinculadas a um programa de substituição de culturas agrícolas, que oferece subsídios a quem aceita trocar a produção de coca por cacau e café em 2019.
Já nas Filipinas, região detentora do 2° lugar no ranking, 16 pessoas foram assassinadas devido a conflitos entre ativistas e o setor de mineração. O sangue também mancha a situação do agronegócio local, que detém mais de 85% dos ataques registrados na Ásia e 90% dos casos que foram documentados no país.
Apesar de enfrentarem ameaças frequentes, discursos de deslegitimação e embates diários na luta pelo planeta, os ativistas ambientais e defensores dos direitos humanos desempenham papel imprescindível na luta por justiça climática e social. São eles os responsáveis por vigiar as ações irregulares e denunciá-las.
Se realmente queremos fazer planos para uma recuperação ecológica centrada na segurança, na saúde e no bem-estar de todos, precisamos abordar as causas estruturais dos ataques aos defensores da terra e dos direitos humanos e seguir seu exemplo para proteger o meio ambiente e deter o colapso climático.
Destaca Rachel Cox, assessora de campanha da ONG GW.
Essa classe da sociedade representa força, determinação e esperança de que um amanhã mais verde, justo e seguro é possível.
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Por Luana Coggo – Fala! PUC