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A relação do Brasil com a ciência

Tradições, abordagens e métodos tipicamente brasileiros a respeito da pesquisa e produção científica nacional

Durante mais de 300 anos, Portugal estendeu seu domínio ao Brasil, fazendo da colônia estabelecida aqui, uma grande fonte de riqueza e matéria prima. E uma das formas adotadas para o melhor controle dessa natureza foi o estudo do território brasileiro. Diversas expedições foram organizadas com o intuito de se conhecer o que aqui havia. Sendo assim, uma espécie de atividade científica no Brasil ocorre desde 1500. A ciência, na época colonial, era produzida principalmente por jesuítas. Observavam e registravam costumes indígenas, espécies de animais, flora e fauna locais. A produção científica e a exploração andavam lado a lado.

Dando um salto na história, com a difusão dos ideais iluministas, Portugal, como diversos países europeus, investiu ainda mais na introdução de práticas científicas no Brasil. Mais expedições foram realizadas, e agora desta vez, aliadas a interesses militares. O ano de 1808 foi marcado pela vinda da Família Real e a consequente transformação da cidade do Rio de Janeiro em um centro político, cultural e científico.

A partir desse marco, diversas instituições foram fundadas ao longo de todo o século XIX, como por exemplo, o Colégio Médico da Bahia (1808), Escola Médica do Rio de Janeiro (1808), Museu Real (1818) e a Escola Politécnica (1874). O Estado se revelava então como um grande incentivador da produção científica brasileira, estando em harmonia com o comportamento secular de diversos países europeus. O advento de diversas escolas de engenharia, medicina e museus de história serviam então para mostrar que a colônia de Portugal aproximava-se dos parâmetros europeus de civilização, sendo, então, um aspecto diretamente relacionado à vinda da família real e sua corte ao Brasil.

Os cientistas desta época em questão dividiam-se em múltiplas atividades, possuindo métodos, abordagens, instrumentos e atividades diferentes dos cientistas contemporâneos. O costume brasileiro de dizer “doutor” para não necessariamente àqueles que são doutores é advindo desta época. Desde o início da instalação de academias no Brasil, a área da saúde pública sempre possuiu mais prestígio e era símbolo de solução de problemas sociais, atraindo quase que exclusivamente, muitos investimentos a essas áreas. Diversos médicos brasileiros possuíram a oportunidade de acompanhar de perto a produção científica dentro dos centros europeus, sendo bastante pioneiros.

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As Transformações do Século XX

Segundo o sociólogo brasileiro Simon Schwartzman, a fundação efetiva da comunidade científica brasileira se dá com o surgimento das universidades, gerando, assim, a profissionalização da ciência brasileira. Para ele, as universidades existentes durante o período colonial brasileiro possuíam características herdadas da tradição ibérica: apegada à religião e de certa forma distante do pensamento reflexivo e crítico.

No início do século XX, em 1900, funda-se o Instituto Oswaldo Cruz, institucionalizando a pesquisa científica no Brasil. Os anos de 1930 marcaram uma revolução do método científico brasileiro, fazendo o Brasil “acordar de seu sono colonial” e romper com um “passado alienígena”, como diz o escritor Paulo Prado.  Em 1935, cria-se a Universidade de São Paulo e a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FFCL), e diversos professores estrangeiros acabaram por vir lecionar nas Universidades brasileiras, e a primeira grande massa crítica com pensamento científico foi formada no Brasil.

Os cientistas desta época focavam, principalmente, em construir uma ciência genuinamente nacional, dispensando a cópia e imitação de produções científicas europeias. Diversas revistas abriram espaço para cientistas divulgarem seus projetos e descobertas, trazendo, assim, a ciência um pouco mais próxima da sociedade brasileira. E, depois, estes mesmos cientistas estavam presentes em diversos congressos internacionais, promovendo mais um local de representação do cientista brasileiro.

O contexto pós- Segunda Guerra Mundial influenciou muito o jeito que o Brasil e outros países do mundo passaram a enxergar a produção científica. Ligado a razões estratégicas, militares e econômicas, a ciência passou a ser vista como assunto de Estado. A pesquisa científica e a tecnologia tornaram-se uma importante ferramenta de domínio e hegemonia. No Brasil, essa perspectiva se dá com mais força somente a partir os anos de 1970. Ciência e tecnologia apareceram pela primeira vez no Plano para o Desenvolvimento no período de 1973 e 1974, e consequentemente, após essa aparição, foi aprovado o Primeiro Plano Básico para o Desenvolvimento da Ciência e Tecnologia no mesmo intervalo de tempo.

Após este momento de certa eficácia do investimento a ciência e tecnologia, os anos 90 mostram uma face diferente. No ano de 1991, no artigo “A questão da ciência no Brasil”, o já falecido físico nuclear ítalo-brasileiro e Professor Emérito do Instituto de Física da USP, Oscar Sala, afirmou que o investimento em ciência já vinha caindo drasticamente desde aquele ano. “No ano passado, em alguns laboratórios, o dinheiro disponível era praticamente nulo. Como consequência, os equipamentos estão-se deteriorando pela absoluta falta de uma infraestrutura de manutenção.”, escreve Oscar. Naquela época, a situação já era de considerada preocupação com o futuro da ciência no Brasil. Para Oscar, “As promessas são muitas, mas a realidade parece ser diferente e dura”.

Fazer ciência no Brasil de hoje

Atualmente, o Brasil ocupa a 13º posição no ranking da produção científica mundial. Resultado da ampliação dos cursos de pós-graduação e expansão das Universidades públicas e instituições científicas. Porém, a realização da pesquisa científica no Brasil ainda se vê com muitos obstáculos a sua frente. Para Igor Copoli estudante de Ciências Sociais da UNESP e pesquisador, um dos principais empecilhos é a falha na educação. “Fazer pesquisa no Brasil hoje não é fácil, primeiramente porque não é muito divulgado nas escolas, então, é pouco valorizada até mesmo entre os estudantes.”, disse Igor.

A falta de concessão de bolsas de pesquisa e investimento nas ciências também é outro problema que o Brasil leva adiante. “O que me barra em fazer pesquisa e, também barra outros pesquisadores, são os diversos cortes nos investimentos do Estado, fazendo com que o número de bolsas seja cada vez mais reduzido”, contou Igor. Muitas vezes, não é possível sobreviver apenas com a realização da pesquisa científica, pois a possibilidade de se conseguir uma bolsa é difícil e se obtida, seu valor é baixo. “Você acaba tendo que buscar outro emprego para conseguir ter uma vida financeira”.

Outro aspecto brasileiro em relação à ciência é a falta de valorização ao seu pesquisador. “O pesquisador brasileiro é pouco reconhecido no Brasil, mas, no exterior é de grande relevância. Basta observar como é com Paulo Freire, Fernando Henrique Cardoso, Sérgio Buarque de Holanda. São todos autores e pesquisadores que, apesar de terem seu reconhecimento no Brasil, são muito citados e conhecidos no exterior”.

“O pesquisador brasileiro é pouco reconhecido no Brasil, mas, no exterior é de grande relevância. Basta observar como é com Paulo Freire, Fernando Henrique Cardoso, Sérgio Buarque de Holanda. São todos autores e pesquisadores que, apesar de terem seu reconhecimento no Brasil, são muito citados e conhecidos no exterior”.

A ausência de uma educação pública de qualidade atua novamente como outro fator que contribui para a falta de reconhecimento ao pesquisador brasileiro. “Não há contato da universidade com a sociedade civil, principalmente as camadas mais pobres, fazendo com que essa não lute por uma universidade gratuita e para todos, pois não tem conhecimento sobre a importância do que acontece ali, das pesquisas.”, relatou Igor.

Há também a valorização nichada da ciência, elevando algumas áreas sobre outras. “Existem áreas mais valorizadas, a das biológicas é provavelmente a mais valorizada e a que mais recebe investimentos atualmente.”, disse Igor. Esta característica pode ser relacionada a diversos interesses. “Essa valorização é completamente associada aos interesses do capital, basta observar o grande número de cursinhos específicos para medicina e a grande expansão de faculdades de medicina”.

Consequentemente, as outras áreas científicas acabam sendo prejudicadas em relação aos investimentos. “A sua supervalorização evidencia a desvalorização de outras áreas, principalmente das ciências humanas, que pouco recebem investimentos, apesar de ser a área mais barata para se investir. Conseguir uma bolsa de pesquisa no Brasil de hoje é difícil, num curso de ciências humanas é duas vezes mais difícil.”

Aliada a uma excessiva quantidade de impostos de importação, burocracia em processos de licitação para compra de equipamentos destinados a pesquisa e a falta de um planejamento por parte do governo em relação aos investimentos destinados a ciência- gerando cortes e contingenciamentos abruptos- fazer ciência no Brasil hoje é uma tarefa extremamente desgastante e barrada de diversas maneiras.

Futuro?

Em paralelo ao contexto atual de diversos e sérios cortes em universidades e instituições federais, fazendo piorar a situação financeira das instituições que já estavam sofrendo com a falta de verba, o Brasil prejudica o avanço da produção científica e da qualidade de vida de diversos pesquisadores e pesquisadoras nacionais.

“Acredito que, enquanto a sociedade civil não tomar conhecimento da importância da ciência e da pesquisa, nós, pesquisadores, seremos cada vez mais marginalizados e desvalorizados.”, falou Igor Copoli. Perspectivas de futuro, soluções e possíveis avanços relacionados a diversos problemas que o Brasil enfrenta tornam-se ainda mais nebulosos.

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Por Maria Antônia Anacleto – Fala! Cásper

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